terça-feira, 23 de dezembro de 2008




PODEMOS FICAR AQUI?


Paulo Henrique de Oliveira






Jesus nasce sempre. Ele é o “Oriens”, “o que nasce”, como nos diz a Sagrada Escritura. E ele nasce sempre que O queiramos em nossos corações. Peçamos essa graça. Uma graça nada mais é que uma jóia em uma caixinha. Para abri-la é necessária uma chave, que é a oração, e a pessoa que no-la abre é Maria. Estejamos, pois, lado a lado com Ela, abramos e contemplemos quantas caixas Deus quiser presentear-nos.

Cristo nasce. Nasce em uma cova prosaica, fria, esquecida. Por quê? Porque Ele o quis. Talvez porque Ele quisesse que fosse símbolo de todos nós, pobres pecadores. Nossa alma é como a gruta de Belém. Se é assim apresentemos a Ele este presépio virgem, talvez sombrio, para que nessa noite receba a Luz. E agora, relembremos o que houve naquela noite-dia e naquela cova-céu. Vamos observar, só observar. Em silêncio, com olhos bem abertos.

Há um homem caminhando em uma noite escura e silenciosa. As estrelas do firmamento emitem uma luz tênue e débil. O cheiro do mato é suave. O homem caminha solitário, deixando atrás de si uma mulher grávida e seu jumentinho. Tem em uma das mãos um cajado alto com uma ponta retorcida. A que toca o chão está lascada pelas longas jornadas. Caminha pressuroso a uma gruta, a uma cova que vê à sua frente. Não sabe o que encontrará ali, quiçá um chacal, quiçá um lobo, quiçá ladrões. Teme, mas avança, pois sua missão é muito maior que seu temor. Ao entrar nela uma luz, vinda não se sabe de onde, ilumina seu rosto e o inóspito lugar. Ao passar entre as estalactites, sente que há palha cobrindo parte da terra fria, e em um canto, observa que há um boi e um burro. Eles o olham. Ele olha para eles. A luz dá vida ao seu rosto e desvela uma face formosa, viril. Seu olhar belo, sereno, profundo observa cuidadosamente cada detalhe da cova. Ali, só os dois animais vêem que os olhos daquele homem estão marejados de lágrimas. Pela cabeça daquele homem passam muitas idéias, muitas imagens. Sabe quantas mulheres morrem ao dar à luz, mesmo tendo a ajuda de uma parteira. E ele sequer poderá dar isso à sua amada. Sequer isso... Observa o musgo que cresce ao redor das fendas feitas pela água que corre serpenteando em uma das extremidades da gruta. Sente o cheiro dos animais. Também está cansado. O cansaço, o forte odor do lugar, o vento frio, fazem perder forças e apoiar-se em seu cajado. Olha para a entrada da gruta e vê o céu. Seu coração se revigora e ele se endireita. Ele pensa: ali terá que nascer o filho de Deus, naquela cova, em um estábulo de animais... Ele então se aproxima do burro, afaga-lhe a fronte e com os dedos acariciando seu pelo olha também para o boi e diz: “Amigos, podemos ficar aqui? É que na cidade não há lugar para nós (e lhe rolavam as lágrimas), não há lugar para nós”...

Esses animais serão testemunhas de grandes coisas. Viram o choro de José. Pouco depois o choro de Maria. Finalmente, com o choro da Virgem, vai brotar um ainda mais doce, o primeiro choro de Deus. O bebê nasceu, e José o repousa nos braços fatigados de sua mãe enquanto sai apressado a buscar água para limpar o Menino. Maria tem então uma cena maravilhosa ante seus olhos: o Menino ensangüentado em seus braços... Maria representa a humanidade e contempla seu sangue no Menino Jesus coberto com o sangue da humanidade. Essa cena haverá de repetir-se mais uma vez, no Calvário, mas, dessa vez, será a humanidade que estará coberta com o sangue de Cristo...

Aqueles pobres animais só contemplam. O burro vê José colocar algo na manjedoura e se levanta, dirigindo-se alegremente ao seu lugar habitual de alimentação. Mas, ao chegar não encontra ração, encontra Deus. Ele vê Deus. Talvez, como vemos na vida de S. Antonio de Pádua, ele tenha se ajoelhado diante de Cristo. Gosto de pensar que sim. E Maria lhe sorriu. Que cena inenarrável de humildade. Deus num presépio em um “prato” de animais. Sim, ali está Deus, pronto para ser devorado. Poderia haver mais bela figura eucarística que esta?

Dessa mesma maneira Cristo vem aos nossos refúgios que chamamos coração. E muitas vezes somos como esses animais e Maria O repousa em nossos corações para que possamos nos alimentar de Sua carne e dignificar nossas almas. Afinal, que é uma manjedoura, um presépio, um coração sem Deus? E com Ele, o que é? Aprendamos com esses animais a escolher a Deus ou à ração de nossas paixões desordenadas. Ou Deus ou elas... Escolhamos... Mas escolhamos com sabedoria. Oh! Se tivéssemos essa boa vontade que cantavam os anjos! Ele habitaria muito mais em nossas almas! Reflitamos, pois, porque Cristo não escolhe palácios. Ele prefere os lugares sujos, miseráveis, frios, escuros... Gosta de nossos corações... E para quê? Para convertê-los, purificá-los, aquecê-los, iluminá-los, divinizá-los. Façamos nossa parte. Imitemos Maria. Saibamos dizer uma simples palavra: Sim!

Se assim fizermos, meus caros amigos, não tenhamos dúvida. A Virgem fará de nossas almas um eterno Natal.



Paulo Henrique de Oliveira, 23, é meu filho, diretor de produção e pesquisador da Oliver, Empreendimento Educacionais.

Eu, minha esposa Sonia, e todos os meus filhos, Maria Theresa, Paulo Henrique, Helena Cristina, Ricardo Luís, Marcelo Augusto, Anna Cecília e Rafael Henrique, desejamos a todos Um Natal muitíssimo abençoado e um Ano Novo pleno de realizações e felicidades.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008



ENSINO, DOUTRINAÇÃO, MANIPULAÇÃO

Valter de Oliveira


Quando se fala em doutrinação muita gente pensa nos movimentos totalitários, seja o nazi-fascista, seja o socialista marxista. E está correto. Tais movimentos são brutalmente doutrinadores.

Contudo, a doutrinação é um fenômeno muito mais amplo. Nós a encontramos entre totalitários e liberais, nas ditaduras e nas democracias, nos meios laicistas e nas fileiras cristãs. E isso acontece toda vez que se tem uma visão errada do ensino, da educação, e, principalmente, do homem. Em vários momentos de minha vida tive que enfrentá-la. E, para surpresa minha, não só no campo do adversário. O que senti na pele encontrei bem descrito na pena de um escritor francês.

Há muitos anos, quando iniciei meu curso de mestrado na USP encontrei na livraria do prédio de História um pequeno livro, “A Doutrinação”, de Olivier Reboul (1). Gostei tanto que, na semana seguinte, comprei uns dez exemplares e os distribuí entre meus amigos. O artigo de hoje é, simplesmente, cópia de algumas páginas deste livro. O texto dispensa comentários.

Na introdução da obra Olivier Reboul faz as seguintes considerações:

“Interrogarmo-nos sobre a doutrinação é maneira de refletir acerca do ensino. Maneira um pouco perversa, sem dúvida, mas muito eficaz. Pois, se o termo “doutrinar” é pejorativo, é com referência a certo tipo de ensino tido como válido, e cujos critérios permitem, em compensação, definir a doutrinação e condená-la.

É evidente que a maneira pela qual um autor define a doutrinação depende de sua própria doutrina. Adiantemos, pois, desde já, os dois postulados fundamentais de todo este livro.

O primeiro é que um ensino verdadeiro tem por fim, qualquer que seja seu conteúdo, formar seres adultos: seres capazes de assumir sua responsabilidade e manter seu compromisso, pensar por si mesmos, respeitar os fatos, ainda quando vão contra sua vontade, e ouvir os outros, ainda quando os contradigam. Todo ensino que se afasta desse fim me parece contra-ensino.

O segundo é que um ensino verdadeiro não poderia ser neutro. Certamente, não pretendo que o professor tenha o dever, ou mesmo o direito, de fazer propaganda em classe, nem de procurar “converter” seus alunos. Há, porém, algo mais triste que um professor tendencioso: é um professor entediante. O primeiro pode vir a influenciar os alunos, o segundo se arrisca a aborrecê-los, o que é, no final, a pior influência. Eis um postulado que os administradores de todos os países dificilmente admitirão, menos preocupados que estão em ter mestres interessantes que em ter paz. Mas, se devessem um dia voltar à escola, que espécie de mestre desejariam: o tendencioso ou o enfadonho?

Dir-se-á que a questão se apresenta diversamente com crianças, a quem se trata, antes de tudo, de “preservar”. Mas de quê: de doutrinas perigosas ou do direito de ser informado, de refletir, de tornar-se maior?

Meus dois postulados subentendem este livro todo, o qual deverá, em compensação, não somente justificá-los, mas conciliá-los, mostrar que, em realidade, são apenas um. Ou que podemos ser liberais sem ser neutros.” (Introdução, XV, XVI)

Depois de explicar três abordagens do problema (a do sentimento popular que associa doutrinação às suas formas extremas, a literatura filosófica anglo-saxônica, individualista, liberal, positivista, e, finalmente, a filosofia educacional francesa para quem a questão da doutrinação não se apresenta ao nível das relações individuais e, sim, das instituições, Reboul vai fazer sua reflexão acadêmica procurando um caminho diferente dessas duas escolas.

No capítulo primeiro, intitulado “UMA PERVERSÃO DO ENSINO” ele vai procurar distinguir a doutrinação de outras formas de manipulação como a propaganda e o condicionamento. Para isso ele examina casos inegáveis de doutrinação. Cita treze (2).


Mentira, Sinceridade, Má fé

Depois de discutir a questão da intencionalidade da doutrinação Reboul discute a sinceridade do doutrinador.

“Neste caso, mais que de intenção, antes caberia falar de self-deception, da má fé no sentido sartriano. Quando doutrinamos, ignoramos o que fazemos. E a ignorância é, paradoxalmente, voluntária, no sentido em que se diz: “Não quero saber disso!”. Essa ignorância desejada apresenta dois aspectos:

1. O doutrinador está a tal ponto convencido daquilo que prega, que admite certa distorção da verdade para convencer os outros da veracidade de sua causa. Assim, pode esconder certos fatos contrários à sua doutrina por pensar que ela o merece; igualmente, pode defender certos aspectos de sua doutrina que lhe repugnam in petto; assim, esse catequista que ensina o culto dos santos sem crer nele; esse stalinista que, embora chocado pelo culto da personalidade, justifica-o “para não dar o flanco ao adversário”. Em suma, pensamos, (sinceramente) que o fim justifica os meios, que o valor da causa faz, das mentiras que exige, mentiras piedosas. Mentiras pedagógicas!”

2. “No mais das vezes, o doutrinador ignora totalmente que doutrina. É que abafa em si mesmo as objeções antes de abafá-las nos outros; é tanto mais fanático quanto menos seguro do que ensina; se mente, é, em primeiro lugar, a si mesmo. Tal é a má fé: sinceridade adquirida com o enganar-se a si mesmo, com o abafar, em si, o que seria necessário de lucidez e de espírito crítico para mudar de opinião. Mostra que a palavra “sinceridade” não tem o mesmo sentido que a palavra “honestidade”.”


O doutrinador doutrinado

A seguir Reboul explica um pouco mais o que entende por sinceridade do doutrinador. Citemos dois de seus argumentos:

1. Primeiro, o próprio doutrinador é doutrinado. Ao menos, quase sempre. Dir-se-á que esse não é o caso quanto ao inventor de uma doutrina. E, entretanto, esta é, sempre, síntese de elementos preexistentes, inculcados, de uma forma ou de outra, ao doutrinário. Hitler havia bebido seu nacionalismo pan-germanista, seu anti-semitismo, seu culto da força nos meios racistas e chauvinistas de antes de 1914.

2. De outra parte, quando se fala de doutrinação, costuma-se esqec demais a responsabilidade dos que a sofrem. Está, sem dúvida, ausente nas criancinhas. Mas quanto adolescente, quanto adulto continua bem infantil para engolir um pensamento pronto e acabado que os libera da dificuldade de refletir e da angústia de duvidar! Quantos, em qualquer idade, buscam um guia, um chefe, um pai, que os livre do fardo de pensar por si mesmos, de querer por si mesmos, de ser eles mesmos! Muito homem “pede” para ser doutrinado; e a doutrinação vinga tanto pela preguiça e pela covardia de suas vítimas quanto pela má fé de seus autores. O doutrinador mais perigoso é a criança que permanece no homem e, como diz o poeta, impõe a lei ao homem: And thus the child imposes on the man.

Retrato do doutrinado

“Desde que julgamos a doutrinação pelo resultado, podemos terminar por um retrato do doutrinado: o retrato-robô de uma espécie de robô! Reconhecemo-lo, com efeito, por certos traços que permanecem constantes, qualquer que seja a doutrina.

O primeiro é a tendência a mascarar os fatos que o contrariam, e mascará-los aos próprios olhos.

O segundo é o caráter unilateral de seus argumentos; não é homem que pese o pró e o contra; ou tudo é pró, ou tudo é contra.

O terceiro não é a ausência de lógica, mas o caráter sofístico de sua lógica; petições de princípio, raciocínios ilegítimos, equívocos dos termos utilizados, etc.

O quarto é o recurso à retórica, precisamente para mascarar as falhas de sua lógica; a metáfora, o eufemismo, a hipérbole são suas figuras favoritas) (Quanto a mais indicações precisas, permito-me remeter a meu livro Le slogan, “Complexe”, PUF, 1975, cap. II).

O quinto é o aspecto rígido de sua linguagem, o abuso de fórmulas feitas, dos lugares comuns, dos slogans, tidos por evidências; pensa por “pensamentos” de confecção” (Cf. ibid., cap. III).

O sexto, que explica os precedentes, é o receio de duvidar, de “mudar de idéias”, de não ter razão, de não saber: o receio de pensar.

O sétimo, que decorre do precedente, é o ódio de todos que podem perturbar-lhes as certezas, de todos que pensam.

O oitavo é certo maniqueísmo a respeito dos valores, das doutrinas ou dos homens que as encarnam; para ele, tudo quanto não é branco é negro, tudo quanto não é verdadeiro é falso, etc.

O nono é a ausência de auto-crítica, de recuo de si mesmo; pode, sem dúvida, dar prova de espírito crítico muito sutil, sempre, contudo, a respeito do adversário.

O décimo é a confusão constante entre a ordem da força e a ordem da razão, entre a chantagem e o argumento, entre a submissão e a adesão, entre o fato de vencer e o fato de convencer.

O décimo primeiro é certo desprezo do homem; o homem nunca passa, para ele, de um meio de servir à sua causa ou de um obstáculo que ele precisa afastar.

O décimo segundo é a ausência de humor... (p. 83,84)


Na segunda parte de seu livro Olivier Reboul exemplifica com a doutrinação feita na China de Mao, a doutrinação feita por seitas religiosas e, em seguida, analisa a doutrinação hitlerista.

Finalmente é discutida a questão da doutrinação nas sociedades ditas democráticas e alerta-nos para o risco do que muitos entendem por “educação total”.

Quem encontrar o livro leia, vale a pena!


1. REBOUL, Olivier. A Doutrinação. Companhia Editora Nacional/Edusp.São
São Paulo, 1980

Professor da Universidade de Ciências Humanas da Universidade de Estrasburgo – Especialista em Filosofia da Educação.

2. São os seguintes:

01. Ensinar doutrina perniciosa
02. Utilizar o ensino para fazer propaganda partidária
03. Fazer aprender sem compreender aquilo que deveria ser compreendido.
04. Utilizar, para ensinar, o argumento de autoridade.
05. Ensinar com base em preconceitos.
06. Ensinar com base numa doutrina como se fosse a única possível.
07. Ensinar como científico aquilo que não o é.
08. Não ensinar senão os fatos favoráveis à sua doutrina.
09. Falsificar os fatos para apoiar a doutrina.
10. Selecionar arbitrariamente esta ou aquela parte do programa de estudos
11. Exaltar, no ensino, determinado valor em detrimento dos outros.
12. Propagar o ódio por meio do ensino.
13. Impor a crença pela violência.

Mais para frente vamos comentar alguns deles.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008




MORAL MARXISTA: A PRÁTICA

Valter de Oliveira


Em artigos anteriores procurei mostrar que a esquerda brasileira, e em especial o PT, tem uma visão da moralidade das ações humanas baseada no relativismo marxista. Afirmei também que esta visão da moral que estão implantando na sociedade e na legislação brasileiras, é uma verdadeira revolução cultural conforme o modelo do marxista italiano Antonio Gramsci. (1)

Esta visão, que é desconhecida do grande público, entra violentamente em choque com aquilo que o cidadão comum pensa ser ético.

Vamos aos fatos.

1. O povo e o terrorismo.

O que pensa o cidadão comum sobre o terrorismo? É fácil responder. Basta perguntar ao seu vizinho, a seus amigos, ao vendedor de hot-dog da esquina. Todos vão considerá-lo criminoso. Ninguém entende porque inocentes devem morrer por causa de razões políticas, religiosas ou quaisquer outras. Não importa se quem pratica as ações são separatistas bascos, fanáticos da Al-Qaeda, narco-marxistas das FARC ou pretensos católicos do IRA. Havendo atentados a indignação popular é geral.

2. Mas há exceções.

Onde? Nas cátedras universitárias, setores da mídia, e em certos partidos políticos. É a “intelectualidade” revolucionária. Temos muitos exemplos deles no governo atual. Para estes, o terrorismo – e também a tortura – só são crimes, se forem usados contra militantes da esquerda.

3 – A Lei da Anistia

Como é sabido, Em agosto de 1979, o governo FigueiredoGeisel, promulgou a lei da Anistia que tinha por características ser “ampla, geral e irrestrita”. Entendeu-se que aí estavam incluídos crimes praticados por ambos os lados. Teríamos, assim, a volta dos exilados e condições para o retorno à democracia em mãos de civis.

No poder, setores da esquerda entenderam que a interpretação da lei deveria ser outra. O ministro da Justiça, Tarso Genro, e o secretário nacional de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi, colocaram-se como expoentes desta posição. O PT os apoiou. Passaram a advogar o julgamento dos torturadores que, no mínimo, deveriam ser obrigados a reconhecer publicamente seus crimes e retratar-se deles. Os mais radicais pediam punições. A polêmica pegou fogo. Lula, como sempre, fez de conta que não tinha nada a ver com o peixe. No máximo disse que era problema para o STF resolver.

Tarso Genro e Vannuchi não arredaram pé. Citando legislação internacional afirmaram: o crime de tortura é imprescritível!

Com tanto barulho oficiais da reserva das Forças Armadas reagiram. “Se é para julgar crimes vale para os dois lados. Tem muita gente no governo que vai ter problemas.”

Quando a ministra da Casa Civil, Dilma Roussef, também disse que “os torturadores do período de regime militar não são beneficiados pela lei da anistia”, a imprensa foi perguntar ao presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, o que ele pensava da declaração dela. Sua resposta foi:

“Os crimes de terrorismo são imprescritíveis, assim como os delitos de tortura (...)” (2)

O debate esquentou na mídia. Começaram a divulgar as proezas de Dilma como terrorista.

E o que fez a esquerda? A do PT, boazinha, aburguesada, que adora whisky e festa no arraial do Planalto, saiu em defesa dos companheiros. Seguiu a cartilha de Lênin. Desmascarou-se. Eis o texto:

Executiva Nacional do PT texto oficial de 07 de novembro de 2008.
Nota sobre a Tortura, Anistia e Direitos Humanos

O Diretório Nacional do Partido dos Trabalhadores reafirma as resoluções sobre Direitos Humanos aprovadas no 3º. Congresso Nacional do PT:

a) crimes contra a humanidade não prescrevem;

b) a Lei da Anistia de 1979 não beneficia quem cometeu crimes como a tortura nem impede o debate público, a busca da verdade e da Justiça;

c) a punição aos violadores de direitos humanos é tarefa da Justiça brasileira. Esperamos que o Poder Judiciário atenda aos reclamos das vitimas, especialmente dos familiares de mortos e desaparecidos.

O Diretório Nacional repudia os ataques difamatórios feitos por setores conservadores e antidemocráticos contra os companheiros Paulo Vannucchi e Tarso Genro no exercício do dever oficial de promover o debate público. Ainda, repudia os ataques e as tentativas de descaracterização da militância política dos companheiros Dilma Roussef e Franklin Martins quando da LEGÍTIMA RESISTÊNCIA ao regime ditatorial ao lado de outros milhares de perseguidos políticos. (Destaque nosso)

Cabe ao Governo Brasileiro seguir defendendo, coerentemente, o repúdio à tortura. Cabe ao Poder Judiciário pronunciar-se definitivamente sobre a matéria, de acordo com os princípios de direitos reconhecidos universalmente.

Aí está a caracterização da moral ou da ética política de amplos setores de nossa esquerda. Torturar um militante esquerdista fere os direitos humanos. Seqüestrar, justiçar, matar militares ou executar civis inocentes em atentados terroristas, não. O militante luta pela revolução, pelo partido, pela causa, pelo proletariado. É legítima defesa. É luta contra o Estado da classe dominante. Não viola os inalienáveis direitos da pessoa humana.

Curioso que os terroristas e guerrilheiros, no Brasil e no mundo, jamais perguntaram à s suas sociedades se estas queriam ser defendidas com o derramamento de sangue inocente. Não precisa. Eles são os iluminados. Conhecem o marxismo científico. E podem mentir, roubar, matar.

Terminemos com algumas perguntinhas:

1. Se os governantes que permitem ou aplicam a tortura cometem crime imprescritível o PT vai começar uma campanha mundial pela punição de torturadores cubanos, vietnamitas, russos e chineses?

2. Se torturadores são tão abjetos, por que o entusiasmo de Lula e Dilma pelo General Giap e Ho Chi Mihn? Será que soldados americanos e franceses foram tratados com a dignidade exigida pela Convenção de Genebra? (3)

3. Se é abominável torturar terroristas e guerrilheiros que assassinaram inocentes não é também monstruosa a tortura contra os que são totalmente inocentes? Neste caso porque os ideólogos da esquerda defendem o aborto que poderia ser realizado inclusive em estágio de gravidez avançada? E até ao nascer, como é defendida pelas feministas radicais aninhadas nos partidos e movimentos de esquerda? Despedaçar tais crianças, jogar ácido nelas, arrancar-lhes o cérebro, não é tortura? Tal barbaridade não é crime imprescritível?

E a “intelectualidade” na mídia e nos livros didáticos continuam nos garantindo que revolucionários marxistas são humanistas. Haja doutrinação!

PS: Vou mandar as questões para o blog do Zé Dirceu. Talvez também para o ministro Tarso Genro. Vocês acham que eles vão me responder?

1. Falaremos sobre a revolução gramsciana em breve
2. Comparem com a postura do Papa João Paulo II que condenou o terrorismo do IRA.
3. Por Chico de Gois - O Globo - 11/07/2008 Lula pede para herói da Guerra do Vietnã tire foto com Dilma


HANÓI (Vietnã) - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva no encontro com o general Vo Nguyen Giap, herói nacional e principal estrategista do Vietnã nas guerras pela independência da França e contra os Estados Unidos, pediu que ele aceitasse tirar uma foto ao lado da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, a quem Lula descreveu como uma das adoradoras do líder de 97 anos.

- Queria pedir um favor - começou Lula, dirigindo-se a Vo Nguyen Giap.

- Aquela moça (apontado para Dilma) é minha ministra do Brasil, foi na sua juventude militante de esquerda, ficou três anos e meio na cadeia e ela tem pelo senhor uma verdadeira adoração - apresentou o presidente.

Dilma, que até então se mostrava séria, e cuja presença no Vietnã ainda era uma incógnita, esboçou um leve sorriso, entre feliz e encabulada. Levantou-se, dirigiu-se ao velho líder e deu-lhe dois beijos na face.
(Não é encantador?... que impacto teria na mídia se os beijinhos fossem em Pinochet?)

domingo, 7 de dezembro de 2008



JÓ E O HOMEM DO RIFLE

Valter de Oliveira



Tinha por volta de uns 14 anos. Assistia sozinho um seriado de televisão: “O Homem do Rifle”. Chuck Connors era o ator que representava Lucas Mccain, um vaqueiro que vivia com seu filho, ainda menino, em algum lugar do velho oeste. Por alguma razão, que não me lembro, o garoto estava triste. Talvez estivesse com dificuldades em entender as injustiças e misérias deste mundo. O pai sentou-se ao lado dele e começou a contar uma história. Era a história de Jó. Foi a primeira vez que eu a ouvi. Foi curta, como acontece nos filmes. Mas foi o suficiente para me marcar e me encher de encanto por um livro encantador da Sagrada Escritura. Parece que ainda sinto a voz de Connors dizer em voz grave e terna:


-Havia um homem na terra de Hus, que era justo e reto. Amava a Deus e detestava o mal...

Deus permitiu que o demônio o tocasse e perdesse todos os seus bens, até seus filhos e filhas. E no meio da dor, arruinado, Jó exclamou: “Deus me deu, Deus me tirou, bendito seja o nome de Deus.” Fiquei petrificado e extasiado. Curioso que eu não praticava minha fé. Nem mesmo tinha feito minha primeira comunhão.

Passaram-se alguns anos. Aos 16, comunguei. Aos 17 recebi o Crisma. Foi então que comecei a ver cada vez mais a beleza divina da Igreja. E um belo dia, já por volta de meus 20 anos, voltei a ouvir a história de Jó. Agora de forma mais profunda, mais bela, baseada no “De moralis” de S. Gregório Magno. E, por alguma razão, ficou em minha mente uma outra frase (1) que Jó teria dito aos amigos que o criticavam. Ele, todo chagado, simbolizando Cristo, sentado sobre um monte de escombros, raspando suas feridas com um pedaço de telha, teria exclamado:

“Bendito o dia que me viu nascer, benditas as estrelas que me viram pequenino! Bendito o dia em que se disse: nasceu um varão”

Por que estou aqui, tantos anos depois, a confidenciar meus sentimentos?

Porque creio que é uma imensa lição de vida. Como é belo saber enfrentar a dor, como é grandioso saber carregar a cruz. Aceitar o fardo inevitável. Dobrar-se sob seu peso, mas não quebrar. Receber recriminações, injustiças, abandono. Não temer nem o desprezo nem o esquecimento. E continuar sendo íntegro e reto. “Reparaste em meu servo Jó, que não há igual a ele?”

Ainda agora, em nosso Brasil, tivemos o exemplo de tantas pessoas que muito perderam. Alguns, como Jó, perderam não só seus bens adquiridos com tanto esforço e luta, mas também seus entes mais queridos. Todos vimos imagens muito fortes, de muita dor. Vimos pessoas esperando contra toda a esperança. Homens e mulheres que tinham fé que iriam recomeçar suas vidas. Vi realmente muitas lágrimas. Não vi revolta. Por mais que tenham sido tentados. E por isso creio, que com a ajuda de seus irmãos por todo o Brasil, com nossas orações, também serão recompensados como Jó.



Mas, em nosso mundo há outros males. Eles também pesam sobre nós. Falo da injustiça fruto de tantas indiferenças, da imoralidade que campeia, do aparente triunfo revolucionário de todos os que defendem a cultura da morte. Eles são astutos. Sabem o que querem. Têm por estratégia pintar o mundo pior do que é. E criam um manto de fuligem que cobre nossas almas e convida-nos ao desânimo.

Vamos sucumbir?

Tenho visto homens e mulheres vergados sob o peso de suas preocupações morais. Há poucos dias vi um homem cheio de energia, mas muito preocupado, perguntar quase aflito: “que mundo vamos legar a nossos filhos?” E vi também um senhor já avançado em anos, figura respeitável, desses que é capaz de dar com alegria a vida por seu país e por seu povo indagar: “Haverá tempo para fazermos o que deve ser feito?”

O tempo é a vida de cada um de nós. E temos que preenchê-la de sentido.

Creio que é bom lembrar-se de Jó e seguir seu exemplo. É preciso saber entender a dor, ver e não temer o mal. Manter a fé, a esperança, a caridade. Saber ver sob as aparências. Somos testemunhas disso. Há junto de nós exemplos de dedicação, de honestidade, de humildade, e de entregas que são exemplares. Olhemos nossa esposa e nossos filhos; nossos amigos e colegas, até desconhecidos, cujas virtudes conheceremos só no fim dos tempos. Sim, sem dúvida, há muito mais bem sendo feito do que imaginamos.

Por tudo isso temos que manter o otimismo e a alegria de quem ama o bem. Lutar por um mundo mais justo e mais fraterno é dever de todos nós. Luta que só tem verdadeiro valor se for iniciada em nós mesmos. Combatendo nosso egoísmo e nosso amor próprio; na epopéia do dia a dia, do dever cumprido a cada momento. Quem passa a vida lutando pelo bem é sempre vitorioso, ainda que morra no campo de batalha.

Que o exemplo de Jó anime a todos nós. Que todos possamos um dia exclamar:

Bendito o dia que nos viu nascer, benditas as estrelas que nos viram pequeninos!



(1). Não encontrei a frase no livro de Jó. Contudo, ela corresponde perfeitamente ao espírito do grande patriarca. De qualquer modo tem sempre me ajudado. E muito!

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008


MORAL MARXISTA: A TEORIA


Valter de Oliveira


No artigo “Política e Eleições” escrevi que a esquerda se utilizou e se utiliza do discurso ético para manipular a opinião pública e atingir seus objetivos.

Em geral sabemos que os políticos e os partidos, em geral, atuam de forma maquiavélica. O importante é alcançar o poder e permanecer nele.

Em relação à esquerda muita gente esqueceu que eles também são maquiavélicos. E, ingenuamente, acreditou que eles tinham um verdadeiro discurso ético. Poucos leram sobre a ética ou a moral pregada pelos partidos de esquerda e pelo marxismo.

Na ocasião comentei que se quisermos saber o que eles defendem basta consultar o que seus mentores ou inspiradores escrevem.

Nosso objetivo hoje é simples: mostrar a visão marxista de moral. Para isso, inicialmente, vamos explicar um dos pontos importantes do materialismo histórico de Marx: a afirmação que a infra-estrutura determina a supra-estrutura.

E o que é a infra-estrutura?

É a base econômica da sociedade, ou seja, as forças produtivas (instrumentos, experiências e hábitos de trabalho), mais as relações de produção (as relações instaladas entre os homens, como, por exemplo, o escravismo ou o trabalho assalariado).

E a supra-estrutura?

Conforme Marx ela é formada por todas as ideologias, ou seja, as opiniões políticas, jurídicas, religiosas e artísticas de uma época mais todas as instituições correspondentes: as leis, os partidos, o Estado, a Arte, a Igreja.

O autor do manifesto comunista afirma que as supra-estruturas correspondem à base social que as produziram e são seu reflexo e expressão. Assim, as idéias de lei natural (que nós defendemos), moral, direito, etc, são supra-estruturas que mudam com o mudar da base econômica e, portanto não tem nenhum valor perene. Tudo muda, tudo é relativo.

Na realidade, para Marx as supra-estruturas existentes em uma época determinada correspondem ao pensamento e aos interesses da classe dominante. Por isso, em geral, as supra-estruturas são conservadoras.

Nesta lógica a classe opressora cria a sua moral. A que temos hoje seria a moral burguesa, defensora dos interesses da classe dominante. Cabe aos defensores do povo – os socialistas, conforme Marx – desmascarar a ideologia burguesa conscientizando os oprimidos para que lutem contra os exploradores. É a teoria da luta de classes.

É bom observar que, na concepção marxista, o mais importante não são as idéias, e sim as mudanças que ocorrem necessariamente na base econômica. Estas é que vão mover e determinar a evolução da História que caminharia inexoravelmente para o socialismo, o comunismo e a anarquia. O que o homem pode fazer é lutar para acelerar este processo. Esta seria a missão dos revolucionários. Não basta esperar o socialismo que fatalmente virá. “Quem sabe, faz a hora, não espera acontecer”.

Aqui vem a questão crucial. Supondo que este objetivo revolucionário seja realmente um bem para a humanidade, que meios podem ser usados para alcançá-lo?

Diz Marx:

“Os comunistas desdenham a dissimulação de suas idéias e projetos. Declaram abertamente que não podem atingir seus objetivos senão com a destruição pela violência da antiga ordem social. Que as classes dirigentes tremam à idéia de uma revolução comunista! (1)

Manifesto Comunista


Um ano antes, em Miséria da Filosofia, ele escreveu:

“(...) Até lá, à véspera de cada recomposição geral da sociedade, a última palavra será sempre: “o combate ou a morte: a luta sanguinária ou o nada. É assim que a questão é colocada irresistivelmente”. (2).

Lênin vai ser ainda mais explícito. Ele pergunta:

“Existe uma moral comunista?”

“Sem dúvida. Imaginamos frequentemente que não temos nossa moral própria, e a burguesia, nos reprova, muitas vezes, (...) de repudiar toda a moral.

Em que sentido repudiamos a moral?

“No sentido da moral pregada pela burguesia, que a deduz dos mandamentos de Deus. (...) nós rejeitamos toda moral desse tipo. Dizemos que ela não é mais que mentira e engano (...) Nossa moral depende dos interesses da luta da classe operária.”
(3)

Lojacono cita um texto ainda mais claro:

“Moral é o que é útil e serve ao partido comunista. Para fornecer atividade comunista de qualquer forma é preciso estar pronto a qualquer sacrifício, também a usar métodos ilegais e a esconder a verdade” (4) (Lênin, Der Radikalismus)

Creio que é desnecessário dizer que tais idéias “morais” foram responsáveis por todas as barbaridades praticadas por marxistas no transcorrer da História. Atos terroristas, campos de concentração, fuzilamento de antigos companheiros, modificação dos manuais de História, extermínio sistemático de populações inteiras, genocídios na África.

Alguém dirá: Mas isto é passado. É coisa do totalitarismo soviético. Morreu com Lênin e Stalin.

Infelizmente não é assim. Muitos dos grandes criminosos marxistas continuam sendo cultuados. Pior: é este falso conceito de moral que está sendo inoculado em amplos setores da sociedade e na legislação de nosso país. O que estamos tendo é uma verdadeira revolução cultural marxista gramsciana liderada pelo PT.

Em próximo artigo veremos a prática da “moral” marxista. Seja curioso (às vezes é bom) e aguarde...

Notas

1. Manifesto Comunista.

2. Karl Marx, Miséria da Filosofia (1847) in, PIETTRE, André. Marxismo, Zahar, RJ, 1969, pág, 278,

3 Lênin, sobre a religião
Discurso no dia 2 de outubro de 1920, no terceiro congresso da Juventude comunista russa, in Reale, G. Historia da Filosofia 6, São Paulo, Paulus, 2006, p.463.

4. Lênin, Der Radikalismus, in LOJACONO, Jorge, O Marxismo, Paulinas, SP, 1968, pág. 108.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008




A VELA E O GIZ

Valter de Oliveira




Estava lendo a História do Mundo Feudal, de Mário Curtis Giordano. Relia um texto sobre educação que era baseado em uma grande medievalista: Regine Pernoud. A narrativa levou-me a lembrar coisas da infância. Uma a uma foram passando em minha memória as primeiras imagens da Idade Média que tive quando criança. Uma delas foi a capa de um livro sobre Carlos Magno e os doze pares de França. Recordei-me das aulas do ginásio nas quais desfilavam heróis da Cruzada e da Reconquista. Aprendi também que para os autores medievais o mundo seria um quadro ou um espelho do invisível. Daí o amor que tinham pela alegoria, pelo símbolo. Sendo assim, o homem deveria saber ver as coisas, ver o que elas são e o que simbolizam. E ao fazer isto sua alma sentiria um gozo particularmente doce, cresceria no amor pelo absoluto, teria sede do infinito.

Lembrei-me, então, de uns antigos papéis que tenho em algumas pastas. Saí da sala e vim procurá-los em meu micro-escritório. Primeiro encontrei textos sobre heróis medievais: Godofredo de Bouillon, chefe da primeira cruzada, Bayard, o cavaleiro sem medo e sem mácula, Chatillon, que deu sua vida em uma luta memorável para salvar seu rei, S. Luís. Depois encontrei umas folhas amareladas. Eram parte de um estudo sobre a beleza e a arte.

Os textos eram frutos de belas conversas de bons amigos, ainda jovens, e que procuravam crescer no amor à verdade e ao bem. Estavam estudando um autor francês, Edgar de Bruyne, que escreveu um livro sobre a Estética na Idade Média. O livro os ajudou ainda mais a se encantar com tudo o que era belo. Liam, trocavam idéias, escreviam. E ao estudar a alegoria decidiram fazer um exercício: ver o lado simbólico de uma vela e de um giz. A folha amarelada que tenho em mãos está dividida em três partes, em três colunas. Na primeira há dois textos: o de um livro não identificado e o “exercício” deles sobre a vela. Na coluna do centro há uma foto de uma bela vela num castiçal. Na terceira eles fazem um comentário sobre o simbolismo do giz. Pensei: por que não colocar no blog? É o que faço. É bom lembrar dos amigos (1). Fica como uma homenagem a todo o bem que me fizeram. Só não consegui manter a formatação original.


A VELA


“O aço duro da faca feriu a pederneira, fazendo saltar uma chuva de faíscas. O ruído seco parecia ecoar por toda a imensidão da nave da igreja vasta e escura. Ainda uma vez e outra o aço tornou a ferir, até que uma chama vacilante apareceu no topo da enorme vela de cera, afastando um pouquinho a escuridão e refletindo no rosto pálido e assustado do menino, que cuidadosamente a colocou no chão, ao lado do enorme missal.”

“Procurando as páginas, e com alguma hesitação na pronúncia do latim, o menino começou a ler as primeiras palavras da vigília pascal: “Deus, qui per filium tuum...” “Ó Deus, (...) santificai esse fogo novo tirado da pedra.”

“A chama desenhava sombras fantásticas nas colunas próximas. Mas a igreja era tão alta e tão longa que nada se distinguia, nem das paredes do teto. O menino, a vela e o missal pareciam estar dentro de um globo de luz imerso na escuridão”.


“Uma vela que se consome num globo de luz em meio às trevas. Ela é tão pouca coisa: Um pouco de matéria gordurosa, tendo um pavio por “alma” e nada mais. Mas quando o fogo se apodera dessa alma, que transformação! Esse fogo vai lentamente consumindo o pavio, e a vela gera luz e calor.”

“Assim é o homem, tão miserável e tão pouco em si mesmo: um pouco de carne com uma alma que é apenas um sopro. Mas um sopro de Deus, e capaz de receber o fogo da fé e do amor. E se o homem se deixa dominar pelo amor de Deus, ele se consome lentamente num silencioso holocausto espalhando por toda a parte o calor da virtude e a luz da verdade.”


E assim terminamos. E o simbolismo do giz? Cabe a você imaginar. Pare um pouco, esqueça a correria do mundo moderno, reflita, escreva. (2) Se desejar, mande seu texto para o blog.



1. “Amigo fiel é proteção poderosa, e quem o encontrar, terá encontrado um tesouro”. (Eclesiástico, 6,14).

2. Se Deus criou as coisas à sua imagem, é natural que, contemplando as formas, encontremos os vestígios da Sabedoria Divina.

domingo, 23 de novembro de 2008





POLÍTICA E ELEIÇÕES:
A MANIPULAÇÃO DA ÉTICA


Valter de Oliveira


O motivo que me faz escrever esta breve análise sobre alguns aspectos da política partidária brasileira é a necessidade de mostrar como o tema ética na política tem sido abordado de modo completamente equivocado pela nossa mídia. Equívoco ainda mais preocupante quando vemos pessoas de alto nível moral e intelectual serem enredados nas teias de uma falsa ética. Explico-me.

No final do século passado amplos setores da sociedade brasileira estavam cansados de corrupção política. Para muitos, a vitória do PSDB após o sucesso do plano Real, representava a esperança de uma nova forma de fazer política. Houve melhoras em alguns pontos, sem dúvida, mas longe do que era desejável. Para piorar, FHC não usou seu segundo mandato para fazer as reformas há tanto tempo prometidas. Vários erros de seu governo, e a crise internacional, contribuíram para que o eleitorado passasse a ver esperança em outra seara.

Esperta, a esquerda brasileira havia levantado com força a questão da ética na política. Se o governo, por exemplo, socorria o sistema financeiro, o PT e seus aliados bradavam: “É legal, mas não é moral”. Diziam que era Robin Hood às avessas. Tirava-se do povo para ajudar os ricos. O canto da sereia foi parecendo cada vez mais simpático.

Em 2002 o PT foi ficando mais afável e atraiu antigos adversários. Cresceu o discurso da ética na política. Os marqueteiros foram chamados – e regiamente pagos – para dar os retoques necessários. Ajeitaram a barba de Lula, enfiaram-no em ternos com cortes mais distintos, descoloriram um pouco a bandeira vermelha, acenaram com mil esperanças para os pobres. Os empresários foram sendo cooptados. A classe média, cansada dos desmandos da “direita” (?), sucumbiu. Estava na hora de entregar o País para quem iria gerir com honestidade a “coisa pública”. Assim, muitíssimos brasileiros, (1), que nada têm de socialistas, resolveram dar uma chancezinha ao PT! E Lula venceu as eleições de 2002.
E depois?

Depois, as camadas mais pobres se sentiram amparadas. Tudo parecia melhorar. Lula parecia o rei Midas: tudo o que tocava virava ouro. E a mídia propagava suas proezas. Até que começaram os escândalos. Um, dois, cem, uma infinidade. Cada vez mais o PT se afundava neles. E o presidente nada sabia... Um professor de Harvard indignou-se contra o mar de lama. Afirmou que era o governo mais corrupto do governo republicano. Exigiu impeachment! Hoje é ministro do governo Lula...Sem constrangimentos...(2)

Após longo e tenebroso inverno a classe média começou a acordar. E, graças a Deus, o povo também. Mas continua de pé a pergunta: Por que até mesmo a classe média, que teóricamente tem mais meios e informações para não cair nas garras da mídia gramsciana, foi tão habilmente enganada?

Na verdade tudo acontece porque, como dissemos no início, deixamo-nos enganar por um conceito errado do que é ética.

Ética é só honestidade financeira?

A grande mentira que nos estão impingindo é que político ético é o que não rouba. Alguns “roubavam, mas faziam”. Com o governo Lula teria chegado o tempo de fazer sem roubar. Como se isso bastasse para termos um governo ético. Aliás, até mesmo a honestidade não pecuniária ficou em segundo plano. Não tem importância a aliança política com todos aqueles que, anos antes, eram tidos como corruptos, imorais, inimigos do povo, lacaios do FMI, etc, etc. Menos ainda o que se prometeu durante anos: não ao pagamento da dívida externa, auditoria dos empréstimos internacionais, possibilidade de salário mínimo acima de R$ 600,00 (ou até mais) desde que houvesse vontade política, etc. Tudo isso foi colocado de lado. A nova oligarquia sindical aliava-se à oligarquia dos coronéis. O fisiologismo cresceu como nunca. Coerência não faz parte dessa estranha ética.

Pior foi constatar, ao conversar com alunos e amigos, que muitos não tinham percebido os males dessa ética reducionista. Tanto em aula quanto em conversas lembrei alguns pontos:

1. Se prestarmos atenção veremos que nenhum de nós, no dia a dia, temos um conceito tão simplista da conduta moral de uma pessoa. Ninguém diz: “Meu vizinho é um homem admirável: é bom empresário, trata com dignidade seus funcionários, paga seus impostos, respeita o consumidor. É verdade que espanca violentamente o filho de dois anos e trai a esposa... mas é profundamente ético!”.

2. Robespierre tinha a reputação de incorruptível, o que não o impediu de dirigir a fase mais sanguinária da Revolução Francesa: o Terror. Nossos livros didáticos mostram-se encantados com os aspectos positivos do governo jacobino: abolição da escravidão nas colônias, fim de privilégios feudais, tabelamento de preços, laicização do Estado. Que belos democratas! Que importa que milhares foram condenados à guilhotina, que no altar de Notre Dame se colocou uma prostituta nua simbolizando a liberdade, que em Paris só se podia produzir o pão da igualdade, que....

3. Ainda nesta linha de raciocínio gostaria de relembrar um anúncio feito pela FSP, se não me engano no final dos anos 90, no qual o jornal queria mostrar seu compromisso de informar inteira e honestamente seu leitor. Começava sem imagem, só se ouvia a voz de um locutor:

- “Ele acabou com a inflação no seu país”!
- “Ele acabou com o desemprego”!
- “A economia voltou a crescer!”
- “O povo voltou a sentir orgulho de sua pátria!”
- “Ele... (e aí aparecia uma foto de Hitler)

E a conclusão do anúncio:

-“Você pode mentir dizendo só a verdade!”

Encerrei esta parte comentando com meus alunos que se eu vivesse na Alemanha no início dos anos 30 teria muita dificuldade em alertar a muitos do perigo nazista. Este era um partido trabalhista, que se dizia preocupado com o bem-estar do trabalhador e com as injustiças sociais. Prometia também o fim do caos capitalista, emprego para todos, não ao Tratado de Versalhes e tantos outros males. E claro, um reino glorioso de mil anos! . Como lembrar a meus compatriotas que deveriam ler o que Hitler escrevera no “Mein Kampf”? Ali estava prenunciado todos os horrores do nazismo. Não deveríamos levar as palavras do führer a sério?

Na época muitos foram ingênuos. Desde o homem comum na Alemanha até Chamberlain na Conferência de Munique. O primeiro teve muito menos responsabilidade. É o homem que cuida de sua família, preocupado com seu trabalho, normalmente distante de debates e estudos políticos e filosóficos. O segundo, movido por um falso idealismo, querendo a paz a todo custo, não soube ver com quem negociava. Voltou de Munique acreditando que obtivera a paz para o mundo. Em Londres, ao saber do teor do Tratado, Churchill então deputado no Parlamento, exclamou: “Tínheis que escolher entre a vergonha e a guerra, escolhestes a vergonha e tereis a guerra”.


Qual ética?

Quando o político fala em ética ele, em geral, procura passar a imagem que sabe que o público quer ouvir. A ética do povo em geral é a do senso comum, conforme a cultura do país. Em nosso caso a população considera ético o que é ainda, em vários pontos, conforme valores e condutas baseados em princípios do cristianismo e do direito natural. Já o político utiliza a ética de Maquiavel temperada com outras filosofias:, positivismo, pragmatismo, marxismo, até mesmo liberalismo e, pasmem, a escolástica de S. Tomás.(3) Portanto, em geral, ao falar em ética, ele não está dizendo absolutamente nada. Se quisermos saber o que realmente ele pensa temos que apelar para outras informações além daquelas transmitidas pela mídia. O programa do Partido pode ajudar. Pelo menos nos casos dos partidos mais ideológicos como é o caso do PT e de outros de esquerda mais radical. Só conhecendo mais profundamente as idéias e o comportamento dos políticos e dos partidos é que poderemos dizer se eles são ou não éticos. E nós também deveríamos saber que ética estamos usando ao julgá-los.

Bem, já me alonguei demais. Falta explicar o que Marx, Lênin e companhia Ltda consideram ser ético ou moral. Eles não escondem. Está nos escritos deles. E mais ainda na prática. É tema para outro artigo. Para o qual conto com sua imensa paciência.


(1) Após as eleições fiquei surpreso ao saber que vários amigos, inclusive bons católicos, haviam votado no PT. Razão: acreditavam que o PT era um partido mais ético!

(2) O professor é Mangabeira Unger que chegou a dar aulas para Obama. Hoje é ministro Extraordinário de Ações Estratégicas..Para não cansa-los coloco suas palavras no blog outro dia.

(3) É o caso do MST e dos ideólogos das CEBs que deturpam o conceito de S. Tomás sobre a propriedade.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008




ESQUERDA + FLUMINENSE:

DELENDUS EST CORINTHIANS! *

Valter de Oliveira



Você acredita na teoria da conspiração? Provavelmente não. Eu também tenho minhas dúvidas. Um velho conhecido, o Praxedes, tentou provar-me que a teoria não só é a mais pura realidade mas ainda envolve atores que nunca imaginaríamos que estivessem aliados para praticar o mal. Estranho? Põe estranho nisso. Querem saber? Vou contar. Foi assim:

Estava tomando um cafezinho na padaria do Benjamim quando ele se aproximou e, sem muita cerimônia, sentou-se ao meu lado. Cá entre nós, não fiquei lá muito feliz. Sempre achei Praxedes um homem estranho. Mas naquele dia ele se superou. Contou-me coisas confusas, misteriosas, para finalmente afirmar:

- Pois é meu caro. Conseguimos. O Flu está mancomunado com a esquerda brasileira!

Quase engasguei. Com dificuldade ainda consegui dizer:

- O que você está falando? Ficou louco?

Praxedes parou um instante. Senti um frio na espinha. Seu olhar deixou-me petrificado. Então, dando uma mordida no croissant, digno de melhor sorte, ele pausadamente respondeu:

- Louco? Não, nem um pouco. Vou te contar quando o Flu passou para o nosso lado. Faz 40 anos.

Continuei mudo. Ele continuou:

- Tudo começou em 1968, na passeata dos Cem mil, lá no Rio.


- 68! Exclamei! Na passeata do povo contra a dita...

- Nela mesmo. Mas, já que percebo que você não crê muito no que estou te contando, vou te provar tudo lendo um texto de alguém bem imparcial. Um texto do torcedor mais fanático que o Flu já teve.

- O Nelson Rodrigues!

- O próprio. Ele estava lá. Ele viu tudo. E tirando uma folha do bolso começou a ler as palavras inspiradas do grande teatrólogo:



“(...) sábado último, lá fui eu remexer velhos jornais e revistas. Por coincidência, apanhei o número de Manchete referente à passeata dos Cem Mil.(...) e comecei a repassar as fotografias (...) O bom de Manchete é a impressão perfeita, irretocável. Tudo é espantosamente nítido”.
...
“E eu passei uma hora examinando o material fotográfico. Não sei se vocês se lembram. Mas escrevi na época, várias “Confissões” a respeito. Parecia-me, e ainda parece, que era um acontecimento inédito, nada intranscendente. Até aquela data, só o futebol conseguiu juntar 50 mil brasileiros.”

-“Cada qual levava no seu bolso a sua ideologia, que era a mesma em todos os bolsos. Na época escrevi que não se encontrava, entre os Cem Mil, ou cinqüenta, ou ate 25, nenhum preto. Eu estive lá espiando. Fui testemunha auditiva e ocular da marcha. Como sou uma “flor de obsessão”, não me saía da cabeça a ausência de negro. Se eu descobrisse um – não dois ou três – mas um, somente um, - já me daria por satisfeito.”

- “O fato é que, no dia seguinte, falando com o meu amigo Guilherme da Silveira Filho, fazia um escândalo amargo: “Nem um preto, Silveirinha! Nem um desdentado! , nem um torcedor do Flamengo!... “E o povo, onde está o povo?”. O povo era a ausência total. Não havia uma cara de povo, um paletó do povo, uma calça do povo, um sapato de povo.”.

“E súbito, baixou-me uma luz e vi tudo. Não havia um torcedor rubro-negro, ou um desdentado, porque aquilo era uma passeata das classes dominantes. A coisa era tão antipopular que não apareceu nem um batedor de carteira. Onde há povo, são obrigatórias uma série de figuras: - o vendedor de laranjas, de mate, de chicabon, de mariola.” (1)



Praxedes deu uma parada (ainda bem!) e aproveitei para perguntar:

- Ok. O Nelson diz que não tem pobre, não tem flamenguista, não tem mãe plebéia (2), que foi a passeata das classes dominantes... e?

-Deus do Céu!, exclamou ele. –Você não percebe? Quem são os jovens da classe dominante? Os torcedores do Flu, é claro. E o que gritavam eles? Brasil! Brasil!? Não. Como todos os jovens de esquerda da época, na Sorbonne, em Berkeley, na PUC, bradavam: Vietnã, Vietnã, enquanto olhavam embevecidos fotos de Che Guevara e de Ho Chi Min. Foi ali, meu caro, naquele dia, naquele solo carioca, que nasceu a união do fluminense com a esquerda.

O Praxedes parou um instante. Depois, com uma expressão de angústia e desalento, desabafou:

- É, conseguimos o apoio da classe dominante, do Flu, dos intelectuais, da mídia, dos padres de passeata mas o povo... o povo, o torcedor do Flamengo, do Corinthians, do Bahia, etc, etc... que decepção! Garotada do Flu cantando o Vandré e o povão no samba e no frevo!

Fez uma pausa. Depois continuou:

- E não mudou muito. 40 anos de esforço pra arrastar essa gente. E o resultado? O povão continua alienado. Alienado e ingrato. Olha só a eleição em São Paulo: Corinthianada ganha bolsa família, CEU pros miudinho, camiseta bom-bril do PT, visita de um presidente da hora como o Lula, beijinhos carinhosos da Marta. E o que fizeram? Votaram no Kassab!

Quase que fiquei comovido. A razão pôs meus sentimentos em ordem. E, apesar de cansado da lógica estranha do Praxedes, resolvi tirar uma dúvida.

- Mas por que o ódio contra o Corinthians? Porque destruí-lo?

Praxedes foi incisivo: -Porque a fiel não só não seguiu a esquerda mas ainda mandou 70 mil corinthianos invadirem o Maracanã em 74 humilhando os boys e os cartolas do Flu. Foi demais. Imperdoável. Resolvemos nos vingar.

- É mesmo, disse eu. Quero saber como.

- Muito simples. Apelamos para D. Helder. Ele entrou em contato com os clérigos progressistas europeus e resolveram o problema. Acabaram com o padroeiro do timão.

-Essa não! disse eu, de onde tirou essa?

-Não lê jornal não, meu amigo? A ditadura “cassava” a companheirada. Os teólogos “cassaram” S. Jorge! E com toda a razão. O homem é militar e também protetor do imperialismo inglês. Pior: não encontraram dele nem RG nem CPF. Como ia ser controlado pelo Estado?

Depois desta levantei-me. Não sem antes, dar um sorriso e dizer:

- Praxedes, diga para os seus amigos, que não damos a mínima. Só prova que eles não têm a mínima visão sobrenatural...


PS: A um grande amigo:
Bira: Não liga não. Quando estava saindo do Benjamim senti o cheiro de enxofre. Sabe, no fundo, o que o Praxedes queria era criar antagonismo, luta de classes. Coisa de marxista. Queria que odiássemos a aristocracia fluminense. Esqueceram que somos descendentes de ingleses, que temos a sabedoria grega, a vivacidade italiana, o coração brasileiro. E amamos todo mundo. Nós sabemos o que é a verdadeira pluralidade.
Ah! E quando o timão bate em vocês é com carinho. Só quando vocês merecem..



* “É preciso destruir o Corinthians”


1. Nelson Rodrigues. O Reacionário. Memórias e Confissões. São Paulo, Companhia das Letras, 1995 – artigo: Um pesadelo com cem mil defuntos. Págs 27-30.





Leia mais sobre Nelson Rodrigues em

www.releituras.com/nelsonr_bio.asp_80k



2. Não tinha torcedor do Vasco porque o Eurico não deixou. Do Botafogo não adiantaria muito. Seria só uma estrela solitária...

quarta-feira, 19 de novembro de 2008


PRESIDENTE DO URUGUAI: UM EXEMPLO PARA O MUNDO

Valter de Oliveira




Contrariando uma onda universal de violação dos direitos humanos, o presidente do Uruguai, Sr. Tabaré Vasques, vetou a legalização do aborto em seu país.

Sua atitude merece os mais entusiasmados aplausos por várias razões:

1. Porque fulminou uma manobra ilegal e imoral de setores do Congresso Uruguaio que usaram da fraude para aprovar um projeto de lei que já tinha sido rejeitado.

2. Porque demonstra uma grande firmeza de caráter ao não se dobrar diante de um fortíssimo movimento mundial que utiliza de forte poder econômico, político e da mídia para propagar a cultura da morte.

3. Porque defendeu a inviolável dignidade do ser humano desde a sua concepção, reconhecendo os ensinamentos da biologia moderna, os dados da História recente e, principalmente, ao citar tratados internacionais, por negar que a lei positiva feita pelos homens possa estar acima do direito natural.

Segue abaixo texto que recebi do Dr. Cícero Harada, incansável batalhador do movimento pró-vida, com a declaração de veto do presidente Tabaré Vasques.


O presidente Tabaré Vazquez assinou quinta feira 13 de novembro o veto aos artigos da Lei de Defesa da Saúde Sexual e Reprodutiva que despenalizam o aborto. A Assembléia Geral do Parlamento não possui os votos suficientes para derrubar o veto. Os artigos que despenalizam e regulam a interrupção da gravidez estão contidos nos capítulos II, III e IV, vetados pelo presidente. O capítulo I não foi vetado.

O texto oficial do veto somente foi publicado na tarde da sexta feira 14 de novembro de 2008 no site da Presidência da República.

O documento é um exemplo para o Uruguai e para o mundo.
Afirma no documento o presidente Tabaré Vazquez:

"HÁ CONSENSO DE QUE O ABORTO É UM MAL SOCIAL QUE DEVE SER EVITADO. TODAVIA, NOS PAÍSES EM QUE O ABORTO FOI LEGALIZADO, SUA PRÁTICA AUMENTOU. NOS ESTADOS UNIDOS, NOS DEZ PRIMEIROS ANOS, O NÚMERO DE ABORTO TRIPLICOU, E O NÚMERO SE MANTÊM: O COSTUME INSTALOU-SE. O MESMO ACONTECEU NA ESPANHA.

A LEGISLAÇÃO NÃO PODE DESCONHECER A REALIDADE DA EXISTÊNCIA DA VIDA HUMANA EM SUA ETAPA GESTACIONAL, TAL COMO DE MANEIRA EVIDENTE É REVELADO PELA CIÊNCIA. A BIOLOGIA EVOLUIU MUITO.

O VERDADEIRO GRAU DE CIVILIZAÇÃO DE UMA NAÇÃO MEDE-SE PELO MODO COMO SÃO PROTEGIDOS OS MAIS NECESSITADOS. POR ISSO DEVE-SE PROTEGER AOS MAIS DÉBEIS.

PORQUE O CRITÉRIO JÁ NÃO É MAIS O VALOR DO SUJEITO EM FUNÇÃO DOS AFETOS QUE SUSCITA SOBRE OS DEMAIS, OU DA UTILIDADE QUE OFERECE, MAS O VALOR QUE RESULTA DE SUA SIMPLES EXISTÊNCIA.

ESTA LEI AFETA A ORDEM CONSTITUCIONAL E OS COMPROMISSOS ASSUMIDOS POR NOSSO PAÍS EM TRATADOS INTERNACIONAIS, ENTRE OUTROS O PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA E A CONVENÇÃO SOBRE OS DIREITOS DA CRIANÇA, O PACTO DE SÃO JOSÉ DA COSTA RICA OBRIGA NOSSO PAÍS A PROTEGER A VIDA DO SER HUMANO DESDE SUA CONCEPÇÃO E, ADEMAIS, OUTORGA-LHE O ESTATUTO DE PESSOA.
O PROJETO ADEMAIS QUALIFICA ERRONEAMENTE E DE MANEIRA FORÇADA, CONTRA O SENSO COMUM, O ABORTO COMO ATO MÉDICO (3), DESCONHECENDO DECLARAÇÕES INTERNACIONAIS, COMO AS DE HELSINQUE E TÓQUIO, QUE SÃO REFLEXOS DE PRINCÍPIOS DA MEDICINA HIPOCRÁTICA QUE CARACTERIZAM O MÉDICO POR ATUAR EM FAVOR DA VIDA E DA INTEGRIDADE FÍSICA".

O veto do presidente, como o dissemos, merece o aplauso de todos nós. Deus não deixará de abençoar gesto tão digno.


1. O Dr. Cícero Harada é advogado, Conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção de São Paulo, Presidente da Comissão de Defesa da República e da Democracia da OAB-SP, foi Procurador do Estado de São Paulo.
2. Para ler o texto completo acesse:
sdv@pesquisasedocumentos.com.br
3. A lei queria obrigar todos os médicos a praticar o aborto quando solicitados.

terça-feira, 18 de novembro de 2008
















O Centenário da Imigração Japonesa :

Da Terra do Sol Nascente à “Terra Brasilis”


Cícero Harada


18 de junho de 1908. Nesse dia, chegaram a Santos, trazendo consigo cultura milenar, os pioneiros da imigração nipônica. Eram 800: 781 contratados, 10 espontâneos e outros. No vapor Kasato Maru haviam partido de Kobe, em 28 de abril de 1908. Para eles, um horizonte de esperança se abria. Historiar os fatos em suas minúcias? Não, não é isto que pretendo. Os historiadores o farão melhor.




Criança ainda ia visitar meus avós. Lá, a felicidade imensa de suas presenças. Depois, o sítio, o espaço, o encontro de primos e tios, o ar puro, o céu azul, o sol, um resto de mata atlântica, límpidos riachos, noites escuras, milhões de cintilantes pontinhos, a Via Láctea. Amiúde deitava-me a olhar fixamente aquele céu e, de inopino, mergulhava como que numa velocidade incrível na direção infinda das estrelas. Deus existe, é Ele o Criador, dizia silenciosamente a mim mesmo.

Já entrado em anos, Keida Harada, meu avô, como fazia religiosamente todos os dias desde que chegara ao Brasil, em 1913, escrevia preciosas notas sobre a vida e os acontecimentos. Resgatá-lo é da maior importância para reconstruir a história privada daqueles que para cá vieram. Meu avô e minha avó tinham muito contato com uma parcela grande de famílias japonesas, pois ele fundara e por muito tempo dirigira a Cooperativa Agrícola de Suzano. Compartilhara, assim, com elas, a cortante nostalgia da Terra das Cerejeiras, as doenças, as agruras econômicas, o sofrimento dos tempos da guerra.

Mas não foram só tristezas e angústias. A família tornara-se numerosa. Havia os encontros festivos. As canções, as estórias, a culinária. Depois, a tenacidade, o esforço e a paciência fizeram com que um filho seu, meu pai, pudesse estudar no antigo Ginásio do Estado, então, único no Estado de São Paulo e, mais tarde, bacharelar-se em direito na Faculdade do Largo de São Francisco, onde também me formei.

Quando eu esmorecia, ele, voz firme e entusiasmada, exclamava: “gambarê! Gambarê!” (em português: ânimo, seja forte, lute apesar de todas as dificuldades). E lá, das profundezas de meu desânimo, da dor e do pessimismo, da raiz de meu ser, clamava a Deus a força da superação.

Exigia-nos retidão, estoicismo de samurai, sabedoria, disciplina e muito trabalho. Ensinava-nos que este era o espírito nipônico, do Japão japonês. Nada a ver com o da forte influência do american way of life do pós-guerra. Era assim que iríamos contribuir para o nosso crescimento e para compor e colorir esta linda aquarela do Brasil. “Do meu Brasil brasileiro”, “desse Brasil lindo e trigueiro”, da “morena sestrosa”, das “fontes murmurantes”, da intuição, da criatividade.




Meu avô que nunca perdera o filial e ardente amor à Terra do Sol Nascente, pôde ostentar com orgulho o título de cidadão brasileiro outorgado por decreto presidencial. Com sua mulher, filhos e netos, na saga de milhares e milhares de imigrantes japoneses e descendentes, seus corações puderam sentir o abraço das chamas de um profundo e irremediável amor: amor à terra de Santa Cruz, que com sangue, suor e lágrimas ajudaram a construir. Amor a esta sagrada “Terra Brasilis”! “Terra de Nosso Senhor! Brasil!”



Cícero Harada

Advogado
Procurador do Estado de São Paulo
Conselheiro da OAB-SP
Presidente da Comissão de Defesa da República e da Democracia

Autorizada Ampla Divulgação,
desde que indicada a autoria e obedecido o texto integral
cicero.harada@terra.com.br

domingo, 16 de novembro de 2008



A “POBRE” VIÚVA E MEU SOGRO


Valter de Oliveira



Meu sogro é um exemplo de homem reto. Teve uma vida íntegra, dedicada à família e ao trabalho constante e bem feito. Soube enfrentar as adversidades com o apoio fiel da esposa e a esperança de ver os filhos bem formados. E teve um grande sucesso.

É filho de imigrantes italianos que, como muitos para cá vieram, também passaram por dificuldades. Devido a isto, quando terminou o curso primário, o pai lhe disse que não poderia continuar os estudos. Era preciso trabalhar. Foi, talvez, o primeiro grande sofrimento. Ele amava os estudos e sabia que tinha potencial para crescer muito.

Obediente – e já bem maduro para a idade – conseguiu, em uma fábrica de lâmpadas no Tatuapé, uma vaga de aprendiz. Aos 14 começou sua carreira na empresa. Ficou nela 35 anos. Faltou um dia por ordem médica devido a um estilhaço de vidro no olho durante o serviço...

Um belo dia a empresa deixou o Tatuapé e instalou-se em Riacho Grande da Serra. Ele morava em Guarulhos, na Ponte Grande. Então ficou um “pouco” mais difícil trabalhar. Passou a acordar às 04h30m. Pegava um ônibus até a estação ferroviária, um primeiro trem até o Brás, baldeação para Riacho Grande, outra condução até à fábrica. À noite, já cansado, refazia o percurso em sentido inverso. Chegava em casa às 20h30m... Diversões? Ás vezes, nos fins de semana. Um grande passeio era levar os filhos ao zoológico. D. Norma preparava os quitutes e lá iam eles. De ônibus, é claro...

Depois de aposentado como chefe de seção pediram-lhe que ficasse na firma por mais algum tempo. Passou a trabalhar duas ou três vêzes por semana. Afinal, chegou o dia de realmente parar. Foi homenageado: recebeu um troféu como o melhor funcionário que a empresa tivera. Foi uma bela cerimônia. Já o salário...

Com um exemplo de vida destes poderíamos imaginar uma velhice tranqüila, ao lado da esposa querida, com uma aposentadoria digna, como seria de se esperar de qualquer país que sabe respeitar seus trabalhadores.

Entretanto, mais um sacrifício lhe foi pedido. Um derrame tirou a vida de D. Norma. Logo após uma simples conversa dentro de casa. “Foi embora como um passarinho”, disse ele.

Restaram-lhe os filhos, eternamente reconhecidos e edificados, uma nora e dois genros que o admiram. É uma árvore que ensina a todos nós a lutar sempre, de cabeça erguida, quaisquer que sejam os obstáculos. A viver na terra olhando para o infinito.

Hoje mora com Renato, um bom filho que lhe quer muito, com uma nora carinhosa e dois netos. Devido a isso não precisa da aposentadoria fruto da epopéia de seu trabalho diário. Todos os meses o Estado brasileiro, fiel respeitador de seus direitos, deposita em sua conta ... Preciso citar? O INSS tem déficit, temos um lindo “fator” previdenciário que achata os vencimentos dos aposentados, etc. E os governantes são zelosos guardadores do bem público.

Agora vejamos um outro lado.

Notícias de ontem informaram que a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça decidiu anistiar João Goulart (1) e sua esposa e indenizá-los pelos prejuízos sofridos com sua queda do governo provocada pelos militares. D. Teresa, sua viúva, receberá seiscentos e quarenta mil reais, em parcelas, pelos próximos dez anos, cem mil de imediato como indenização por período que viveu no exílio. O ministro Tarso Genro e o Presidente Lula (2) ficaram muito felizes.

Como se vê, os governos que “amam” o povo têm um grande senso de justiça...



1. O ministro da Justiça, Tarso Genro, declarou que a decisão da Comissão de Anistia foi um ato de justiça tardia e que o ex-presidente Goulart foi deposto por suas qualidades e não por seus defeitos.

2. Em nota enviada à Comissão o Presidente afirmou que Jango era um verdadeiro herói.

Nem foi ato de justiça e nem João Goulart foi herói. É tema para outro artigo. Talvez o escreva. É muito duro para um professor de História ver o passado reescrito em um viés totalmente ideológico. No pior sentido.

quinta-feira, 13 de novembro de 2008


“Pérolas” ideológicas em livros didáticos

Valter de Oliveira


Hoje tive o prazer de ler mais um artigo do prof. Ubiratan Jorge Iório de Sousa, doutor em economia e professor da UERJ, com quem tive ótimas aulas no meu curso de mestrado em Estudos Brasileiros. Na ocasião, ganhei duas coisas: sólidas e claras explicações sobre doutrina econômica e uma leal amizade que já dura quase 20 anos.

No seu último artigo ele analisa uma das questões propostas na última prova do ENADE que ele diz não passar de uma abusiva manipulação ideológica (1). De momento destaco aqui sua última frase: “Já não chega a lavagem cerebral marxista e o relativismo moral que a maioria dos professores de História executam, desde a mais tenra infância, em nossas crianças?”

Lembrei-me, então, de duas coisas: a leitura de um livro de história quando era menino e um comentário que meu caro Ubiratan fez na primeira vez que tive o prazer de recebê-lo em minha casa.

O livro era “História do mundo para crianças”. Autor: Monteiro Lobato. Eu tinha 10 anos. Nem me passou pela cabeça que ele fosse um homem de esquerda. E nem sabia o que era isso.

Aos 17 um professor de História não marxista comentou em minha sala de aula que o livro de Lobato deveria se chamar “Comunismo para crianças”. Entendi então que Narizinho, o marquês de Sabugosa, Emília e, quem diria, a vovó Benta não eram nada inocentes...

Mais de 20 anos depois, em uma conversa em minha casa, nosso bom economista comentou: “Puxa, você é o primeiro professor de História que conheço que não é marxista!”

Na realidade, todo mundo que já passou pelos bancos escolares sabe muito bem que o problema não é apenas dos professores de História. É também de muitos professores de ciências humanas. Apesar da queda do muro de Berlim...

Para confirmar – e não me estender demais – cito aqui uma dessas “pérolas” que encontramos em nossos livros de História, do curso fundamental, da antiga 8ª série. Os autores falam sobre o comunismo chinês e a revolução cultural. Eles já chegam a fazer críticas (?) (suprema ousadia!) à revolução maoísta, mas não resistem a uma recaída... Vejam só:

(...)
“Sob a liderança de Mao Tse-Tung (...) durante a Revolução Cultural, a China viveu um período em que o mais importante de tudo era a crença do cidadão nas idéias de Mao” (...),

“Esse período teve altos e baixos, fatos positivos e negativos, mas o que predominou foi um enorme fanatismo. Por exemplo, os estudantes em geral, principalmente os universitários, e os professores foram obrigados a trabalhar no mínimo dois anos na agricultura, para depois voltarem às aulas.” (Pena que o Stédile e o Rainha não estavam por lá...)

“Os músicos que tocavam clássicos ocidentais – Bach, Beethoven, Mozart – eram ridicularizados publicamente, obrigados a só tocarem música chinesa revolucionária, caso contrário, seriam presos e espancados”.

(...)
“Mas nem tudo foi fanatismo na Revolução Cultural. Ela trouxe também experiências inovadoras e originais. A polícia, por exemplo, foi extinta. No lugar dela, os próprios moradores se revezavam (uma vez por mês por pessoas adultas), no exercício da função policial, sem ganhar nada para isso”. (2)

Pois é, meus amigos, não é comovente? Olha só que boa idéia para o governador Serra...Proteção para todos. Sem greve policial. Sem causar rombos nas finanças do Estado...

E os milhões de mortos provocados por Mao? Nem uma palavra. O aluno que lê este livro de História – e tantos outros cujos autores rezam pela mesma cartilha – jamais desconfiarão que o governo de Mao foi uma das mais sanguinárias ditaduras da História...



(1). O aluno que não colocou a resposta desejada pelos idealizadores da questão perdeu um ponto da nota! O ENADE considera que a mulher só será cidadã se tiver o direito de praticar o aborto! Ilegalidade e abuso de autoridade. Ver http://www.ubirataniorio.org/blog.htm

(2) Extraído de História & Vida, Nelson Piletti e Claudino Piletti, vol, 4, pág. 59, Suplemento de textos, SP, Ática, 1997.
Os autores adaptaram texto de J. William Vesentini e Vânia Vlach, do livro Geografia Crítica, 6ª ed. São Paulo, Ática, 1996, v.4, p.176)