segunda-feira, 7 de setembro de 2009


MENTALIDADE LAICISTA E ANTI-RELIGIOSA NA REVOLUÇÃO FRANCESA



Valter de Oliveira


Em artigo da semana passada (1) criticamos a ação de laicistas que, no Brasil de hoje, querem tirar símbolos religiosos de locais públicos. Lembramos que isso é próprio de uma mentalidade intolerante, incapaz de ver a correta relação entre o Estado e todos os que têm convicções religiosas. Pior: fazia-nos recordar tristes episódios da Revolução Francesa que foram uma vergonha para a história da França.

Artigos de intelectuais católicos e do jornal “O São Paulo”, da arquidiocese paulistana, também relacionaram o laicismo atual com os tristes tempos de Robespierre. É sobre esse período que vamos escrever algumas linhas.

Em 1793, uma facção revolucionária, a dos jacobinos, tomou o poder na França e estabeleceu um governo despótico que os historiadores chamam de “O Terror”.

O líder desse grupo de facínoras foi Robespierre, que estabeleceu a lei dos suspeitos e constituiu um Tribunal Revolucionário. Este passou a julgar e a condenar todo aquele que fosse suspeito de não apoiar a Revolução. Não havia direito a advogado. Duas "testemunhas" eram suficientes para levar um acusado à guilhotina.



Desde o início os revolucionários tiveram especial empenho em perseguir a Igreja. Em agosto de 1790 criaram a Constituição Civil do Clero, que separava a igreja francesa do Papa e do Estado e transformou os clérigos em assalariados do Estado e a cujo governo deviam fidelidade. Os que ficaram fiéis à Igreja foram chamados de padres refratários. Perderam suas paróquias, suas dioceses, suas abadias. Foram colocados fora da lei. Com o Terror, muitíssimos foram presos e executados, como veremos em próximo artigo.

Os pseudo amantes da liberdade entendiam que um Estado laico tem que proibir manifestações e símbolos religiosos em espaços públicos. Não importava que a sociedade, em seu conjunto fosse cristã. Os fiéis não deveriam ter o direito de expor suas idéias e, com elas, influenciar a atuação do Estado. Tentar expressá-las e defendê-las era um insulto. A liberdade não podia suportar a "ignorância e a superstição".

O brado de Voltaire contra a Igreja devia ser seguido à risca: “É preciso esmagar a infame!”

Foi o que tentaram fazer. Vejamos alguns exemplos.

Líderes revolucionários como Hébert e Chaumette promoveram uma campanha de descristianização. Surgiu um novo culto: o da Razão, em honra do qual Robespierre fez uma festa pública.

As propriedades da Igreja foram confiscadas. Na catedral de Notre Dame foi feita uma cerimônia sacrílega. Colocaram uma prostituta representando a deusa Razão. Eis os versos declamados pelos fiéis da nova religião:

“Nos altares de Maria
Colocamos a Liberdade.
Da França, o Messias,
É a Santa Igualdade."
(2)

Catedrais e símbolos religiosos foram destruídos em muitos lugares. A imponente abadia de Cluny, uma das glórias da França, foi arrasada. De seus sete campanários somente um restou de pé.

Thiers narra o ódio contra as imagens:

“Novembro de 1793. A imagem da Virgem foi suprimida em toda a parte, e todas as Madonas que se achavam nos nichos, nas esquinas, foram substituídas pelos bustos de Marat e de Lejelletier” (3)

O ódio chegou à abolição do calendário cristão. Fizeram um novo, revolucionário, a partir da data da proclamação da República Francesa.(4). 1792 foi considerado o ano I. Tinha 12 meses de 30 dias. As semanas passariam a ter 10 dias de 10 horas. 9 dias de trabalho, um para descanso, o decadi. Ademais, estabeleceram 5 dias de festas para a Revolução. Racionalismo métrico asfixiante. Perfeitamente adequado para os ancestrais da cultura da morte. E para seus seguidores hoje.


Calendário revolucionário

Os nomes dos meses, é claro, foram mudados. Mês das Chuvas (Pluvieuse), das Brumas (Brumário), etc. E em vez de dias santificados passamos a ter o dia da enxada, da batata (11º dia), o do nabo (26º dia) e o 19º, acreditem, foi dedicado ao asno! Talvez uma homenagem à inteligência jacobina...

Não contentes em destruir os símbolos cristãos os revolucionários resolveram criar os seus. A deusa Razão não foi suficiente. Também não bastavam seus “heróis”. Era preciso “canonizá-los”. Surgiu o culto a Marat. O historiador alemão, João Batista Weiss, escreve:

“Na igreja dos Cordeliers se erigiu uma câmara ardente, para o coração de Marat, conservado em uma das urnas do Tesouro da Coroa. Ali ardiam círios em honra do novo deus, como agora na igreja em honra de Santa Genoveva. Ia-se lá em romaria; rezavam-se ladainhas com o nome de Marat, e adoravam-se suas feridas e seu coração. Beaulien conta que tivera em mãos uma oração impressa que começava com estas palavras:

“Oh! Coração de Jesus, Oh! Coração de Marat! Oh! Santíssimo Coração de Jesus, Oh! Santíssimo Coração de Marat!.(5)

A Morte de Marat (1793), tela de Jacques-Louis David

A que ponto chegou o laicismo! Com razão disse o historiador das religiões, Mircea Eliade: “O absoluto não pode ser extirpado, pode apenas ser degradado”. (6)

E como!



NOTAS

1. Laicismo, cultura e combate a símbolos religiosos. (publicado no blog www.claravalcister.blogspot.com dia 29/08/2009 e no site catolicaNet no dia 02 de setembro)

2. WEISS, J.B. História Universal, Tipografia La Educación, 1932, vol XVIII, p. 114.

3. THIERS, M.A. Histoire de la Révolution Française , livro XVII, p.191).
.
4. WEISS, op. cit.. vol. XVIII, pág 807 .

5. WEISS, op. cit. vol XVII, p. 404.

6. in PIETTRE, André. Marxismo. Zahar Editores, RJ. 1969.p. 236.