sexta-feira, 7 de fevereiro de 2020

COMO JULGAR OS INIMIGOS DA REVOLUÇÃO?




Lenin responde: “pela consciência revolucionária”

Como é sabido Lenin vivia para a causa revolucionária. Para ser vitorioso em sua luta poderia utilizar de todos os meios tidos por necessários. “A moral”, disse ele, “considerada fora da sociedade humana, não existe para nós, trata-se de uma mentira. A moral, para nós, está subordinada aos interesses da classe proletária”. (Nova Gazeta Renana, 1848-49 – in Piettre, p. 94).

Nessa lógica fica mais fácil entender porque Lenin e seus camaradas não tiveram pejo em implantar o terror. Daí dizer Pipes:

“ O primeiro passo para a introdução do terror em massa foi o banimento da lei e sua substituição pela “consciência revolucionária”. Nada semelhante jamais existira. As autoridades soviéticas dispunham de qualquer indivíduo que estivesse no caminho, na prática, implementando a definição dada por Lenin à “ditadura do proletariado”, como “governo não restringido pela lei” (Pipes, p. 219)

(...)

“Em março de 1918, o regime substituiu os tribunais locais por Cortes do Povo, responsáveis pelo julgamento de todos os tipos de crimes, exceto aqueles de natureza política. Uma lei de novembro de 1918 proibiu os juízes dessas cortes de se referirem a normas anteriores a outubro de 1917, liberando-os da observância dos procedimentos formais. Seu único critério deveria ser “o senso de justiça socialista” (idem).

A Tcheka e o Terror

Resultado de imagem para símbolo da Tcheka.

A Tcheka foi uma Comissão Extraordinária, de caráter policial, encarregada de combater a “contra-revolução e a sabotagem”. “O decreto que a criou, diz Paul Johnson não veio a público a não ser dez anos depois (Pravda, 18 de dezembro de 1927), portanto, a força de segurança permaneceu uma polícia secreta no sentido mais puro, já que sua verdadeira existência não foi oficialmente reconhecida”

“Não havia dúvidas de que, desde o início, a Tcheka estava destinada a usar de crueldade absoluta e em larga escala. (...) Ela recrutou pessoal com incrível rapidez, de dezembro de 1917 a janeiro de 1918 (...).  A polícia secreta do czar, a Okhrana, havia chegado a 15 mil homens, o que a tornara, de longe, a maior corporação dessa natureza no Velho Mundo. Em contraste a Tcheka, em três anos de existência, tinha uma força de 250 mil homens permanentes. Suas atividades eram de ampla escala. Enquanto os últimos czares tinham executado uma média de 17 pessoas por ano (por todo o tipo de crime), até 1918-19 a Tcheka tinha chegado à média de mil execuções por mês, apenas por razões políticas”. (Johnson, p. 54)

“Esse número é certamente um cálculo subestimado – por uma razão intrínseca a iniquidade do sistema criado por Lenin. (...) Quando a Tcheka prendia, julgava, condenava e punia suas vítimas, o número delas não era registrado numa lista confiável. A poucas semanas de sua criação, a Tcheka estava operando seus primeiros campos de concentração ou de trabalhos forçados. Esses surgiram de um decreto da Sovnarkom que arrebanhava “homens e mulheres burgueses”, enviando-os para cavar trincheiras defensivas em Petrogrado. (...) Seus campos começaram a proliferar... o núcleo do que viria a ser o gigantesco “Arquipélago Gulag”. Lá pelos fins de 1917, quando Lenin estava no poder há apenas 9 ou 10 semanas, seria correto dizer que a Tcheka era um “Estado dentro do Estado”, em alguns casos, ela era inclusive o próprio Estado”. (op.cit. p. 55)

Lenin foi responsável pelo Terror?

Sem dúvida, afirma Johnson. Todas as provas que possuímos (mostram isso). “Na verdade foi Lenin quem, pessoalmente, infundiu o espírito de terror na Tcheka e também foi ele quem, de janeiro de 1918 em diante, constantemente forçou a Tcheka a ignorar as dúvidas e os sentimentos humanitários de outros bolcheviques(...). Quando mudou para Moscou ela tornou-se um “departamento independente”, reportando-se diretamente a Lenin. (...) Em janeiro de 1918, três meses antes de a guerra civil ter começado, defendia a ideia de “atirar para matar in loco um entre cada dez julgados culpados de vadiagem”.  (...) em agosto de 1918, Lenin telegrafou ao Soviete de Nizhni-Novogorod: “Vocês devem empregar todos os esforços, formar uma troika de ditadores... introduzir imediatamente um terror de massa, fuzilar e deportar os ex-oficiais, centenas de prostitutas quem fazem dos soldados uns bêbados, etc. Não se deve perder um minuto”. No mês seguinte o jornal do exército proclamou: “Sem piedade, sem hesitação, erradicaremos nossos inimigos às centenas, que sejam aos milhares, que se afoguem em seu próprio sangue... que haja enchentes de sangue dos burgueses”. As incitações de Lenin tiveram resultados. (...) por volta de 1920 a Tcheka tinha aplicado cinquenta mil sentenças de morte”.

Contudo, mais do que as mortes,o mais importante e característico do terror de Lenin, (...)  foi o princípio usado para selecioná-las. (...)  Lenin tinha abandonado a ideia de culpa individual” (para que alguém fosse condenado”. Johnson afirma que começaram a elencar categorias de pessoas que deveriam ser eliminadas: “prostitutas”, “vagabundos”, “caixeiros-viajantes”, “especuladores” (...)  Os decretos de Lenin, continua o historiador, em pouco tempo, se estenderam a classes inteiras. Um oficial da Tcheka, o segundo em importância, era o feroz letão M.Y. Latsis. “Ele é o que mais se aproximou da verdadeira definição de Lenin:”

Martin Latsis
“A Comissão Extraordinária não é uma comissão de investigação, nem um tribunal. É um órgão atuando na frente de batalha de uma guerra civil. Não julga o inimigo: abate-o. Nós não estamos lutando contra indivíduos. Estamos exterminando a burguesia como uma classe. Nós não estamos procurando evidências ou testemunhas que revelem feitos ou palavras contra o poder soviético. A nossa primeira pergunta é: a que classe o indivíduo pertence, quais suas origens, criação, educação, profissão? Estas perguntas definem o destino do acusado. Esta é a essência do Terror Vermelho”. (op. cit. p. 55-56)




Como se vê Pol Pot teve seus mestres. A revolução se repete. Sempre.
Mas, enquanto não está no poder, o militante revolucionário se diz democrata, humanitário...
E não enrubesce ao entoar loas à Revolução Russa e aos criminosos que a implantaram.

Bibliografia:

Piettre, André. Marxismo, RJ, Zahar editores, 1969.
Pipes, Richard. História Concisa da Revolução Russa, Trad de T. Reis. RJ, BestBolso, 2008
Johnson, Paul. Tempos Modernos. O mundo dos anos 20 aos 80. Tradução Gilda de Brito Mac-Dowell e Sergio Maranhão da Mata. RJ. Instituto Liberal, 1990.