sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

A VALORIZAÇÃO DO INFERIOR

 

Introdução


Muito se fala da desagregação da sociedade, da inversão de valores, da negação de princípios que formaram nossa civilização. Tudo isso, graças a Deus, tem provocado uma saudável reação em amplos setores da opinião pública. 

Diz um ditado que "nada de grande se faz de repente". Com efeito, o que temos é um amplo, profundo, gradual processo de secularização que tem por objetivo criar uma nova sociedade, e, mais ainda, com o que se convencionou chamar "um novo homem".

Bento XVI, ao falar da atual crise da Igreja e do desmoronamento dos valores morais, ligou tal processo ao movimento libertário-marxista de 68. Na verdade, filosoficamente, há autores que afirmam que ele começou no final da Idade Média. O nominalismo (1) seria um exemplo do começo do abandono da visão cristã do mundo. 

Contudo, de momento, queremos apenas destacar o que ocorreu do século XX para cá. Para isso lançamos mão do livro de Mário Ferreira dos Santos "Invasão Vertical dos Bárbaros", de 1967 (2). No caso o ponto em que ele trata da "Valorização do Inferior":

Dupla de criminosos Bonnie e Clyde

"Há uma desvalorização desenfreada que se faz na baixa dos valores. Não se trata apenas de uma desenfreada especulação no que é baixo (crime, delinquência, vício, sensualismo excessivo, acentuação das formas viciosas, baixa literatura, supervalorização do herói popular, afagado pelas multidões e recebendo as mais altas pagas, etc.), mas, sobretudo, pela inversão que se faz de tais valores (...). Por exemplo, a valorização da história de gangsteres, de criminosos vulgares e cruéis, como se isso representasse uma vitória sobre a fraqueza" . 

O embotamento da sociedade diante da corrupção

"A valorização de um homem que enriqueceu à custa da malversação do dinheiro público é apresentada como um exemplo de inteligência e capacidade. (3) (...). O embotamento, que se nota na sensibilidade moral de grande parte da população a tais fatos, é mero barbarismo. Os chamados "escândalos" já não escandalizam! Publicam-se nos jornais as notícias as notícias mais espantosas de atos de corrupção, e não há qualquer estremecimento mesmo superficial da epiderme. Aceita-se tudo isso como algo natural e normal. Ladrões da pior espécie são elevados a altos postos, e muitos são reeleitos em campanhas memoráveis (4). Toda a vida pregressa desses indivíduos não faz enrubescer o rosto de milhares e até milhões de eleitores". 

E quanto aos políticos honestos? 

"Os políticos mais limpos (5. Hoje em dia a crítica maior é ao político conservador) veem ameaçadas as suas reeleições, e muitos entram no esquecimento porque seus nomes não estiveram em manchetes de jornais, nem sofreram acusações de crimes dessa espécie. A honestidade é vista como algo ridículo, e o homem crédulo, o homem de boa fé, o homem digno, é motivo para programas humorísticos. Grande parte dessas figuras é apresentada como sendo verdadeiros hipócritas, que na hora precisa, lançam mão do alheio. A intenção é clara: por a dúvida sobre a decência, sobre a honestidade, sobre a honra (palavra quase inaudita, menos ouvida hoje do que nunca). Não se respeita mais a honorabilidade de ninguém. Há sempre quem ponha dúvida sobre a decência e, quando alguém pretende apresentar uma pessoa como exemplo de dignidade, o  menos que se ouve à volta é: "Será? A gente não sabe..." e as reticências ocultam claras intenções. A dúvida é instaurada, e não demora muito que algum mais afoito já diga que ouviu dizer que... e conta, sem assumir responsabilidade, que dizem..."Não sei se é verdade".

É fácil levantar dúvidas, suspeitas. Os propagandistas da indecência sabem disso...

Notas:

1. Nominalismo é uma corrente filosófica. Defende que as ideias gerais, como gêneros ou espécies, não passam de simples nomes, sem realidade fora do espírito ou da mente. Opõe-se ao realismo metafísico.  .

2. Santos, Mário Ferreira. Invasão social dos bárbaros. São Paulo: É Realizações Editora. 2012, p. 48-50. 

3. É o chamado político eficiente, que "rouba mas faz". Ou o que "ajuda a gente"...

4. A manipulação política e mediática contribui cada vez mais para isso. Concretamente, no Brasil de hoje, contribuem para isso o sistema eleitoral proporcional, que dificulta que o eleitorado conheça realmente os candidatos e, sobretudo, que estes sejam responsabilizados após eleitos; partidos políticos sem democracia interna e sem empenho sério em programas além da falta de compromisso com a ética; a imensa manipulação feita pela grande mídia que não consegue esconder mais seu alinhamento ideológico, etc.

5. Por mais críticas justas que tenhamos à classe política seria injusto afirmar que todos são desonestos. Há boa gente preocupada com o bem comum. Sobre estes, com frequência, costuma-se levantar suspeitas e juízos temerários. Do mesmo modo é terrível vermos como facilmente fazem com que as falhas de alguns membros de uma instituição seja lançada sobre toda ela como um todo. Pior: estes que aparentemente têm empenho em denunciar os males de tantos parecem ser partidários de uma nova sociedade cátara, de homens puros, sem falhas. Simplesmente reflexo de uma ideologia utópica que procura dominar a sociedade. 

Observação: os subtítulos em negrito são do blog olivereduc. 

  



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