sábado, 13 de novembro de 2021

MARXISMO, PCdoB E LIBERDADE

 

Valter de Oliveira


Pessoas ingênuas - nem sempre tão ingênuas - adoram afirmar que não há perigo do Brasil se tornar comunista. Seria neurose de gente que não entende nada...

Na verdade são eles que não entendem nem a doutrina marxista e nem a tática que seus partidários adotam.

Os ingênuos acreditam piamente que o marxismo e os partidos que querem implantá-lo são progressistas que amam e defendem a liberdade. Esta seria ameaçada só pela direita. Fascistas ou não.

Segue um exemplo histórico.

É sabido que na antiga URSS opositores editavam "Samizdat". Eram "periódicoa" clandestinos porque obviamente não era conforme a lei discordar do governo. Este dava sua explicação de porque eram proibidos:

"O marxismo-leninismo não reconhece liberdade de expressão sem classe. Nas condições próprias do socialismo, a palavra e o escrito devem servir aos interesses do povo, propagando opiniões progressistas da vanguarda que contribuem para o êxito da construção socialista e comunista". (1) Citado em The Times de 20 de fevereiro de 1969. In  Reboul, Olivier, A doutrinação, Cia. Ed. Nacional/Edusp, 1980, p.32. 

Claro está que se você mostrar o texto a um marxista ele vai responder que na URSS e outros lugares o marxismo foi deturpado. O "ingênuo" vai concordar inteiramente...

Acontece que partidos comunistas e marxistas continuam a existir em todo o mundo. Mudou o marxista? Passaram a ser realmente democráticos, pluralistas, pró-liberdade? 

Segue um pequeno excerto do programa do PCdoB que continua tecendo loas à superioridade do socialismo e do comunismo. 

39. O REGIME político (o socialista que eles querem implantar) garante amplas liberdades para o povo - de reunião, de associação, de manifestação do pensamento, de demonstração pública, de culto religioso, de movimento e de profissão. O exercício de greve é assegurado aos trabalhadores na defesa de seus direitos. Resguardado o interesse coletivo e os objetivos fundamentais do movimento transformador da sociedade, são respeitadas as divergências e contestações às diretivas do Governo e igualmente, a diversidade de organizações e partidos políticos democráticos e progressistas, desde que respeitem a legalidade socialista" (2) Destaque em negrito é do blog.

O texto oficial do PCdoB mudou alguma coisa em relação ao pensamento imposto na antiga URSS? Claro que não. Ambos os textos, como podemos ver, são baseados em um "Tríplice postulado" bem expressos por Reboul. :

1. "A doutrina marxista-leninista é a única verdadeira" (6º caso de doutrinação no livro de Reboul);

2. "Só ela serva aos interesses do povo".

3. "O governo soviético ( o antigo e o que o PCdoB e outros querem implantar) é o depositário dessa doutrina. Daí se conclui que todo ensino que dela se afaste é falso, nocivo ao povo, e é, pois, de proibir-se" (3). 

Será que convenci algum ingênuo?

Notas: 

1. Citado em The Times de 20 de fevereiro de 1969. In  Reboul, Olivier, A doutrinação, Cia. Ed. Nacional/Edusp, 1980, p.32. 

2. O destaque em negrito é do oliver. 

3. Op.cit. p. 32-33.  



quinta-feira, 11 de novembro de 2021

ELEIÇÕES NA NICARÁGUA. O MUNDO CRITICA. O PT ELOGIA

 

 

ELEIÇÕES NA NICARÁGUA

O mundo critica. O PT elogia...

Depois se arrepende...

Valter de Oliveira

 

Dia 8 p.p. houve eleição na Nicarágua. Daniel Ortega foi reeleito pela quarta vez.

Conforme a CNN Brasil “O atual governo é criticado pela prisão de líderes da oposição. Além disso, o processo eleitoral é questionado por Estados Unidos, União Europeia, Organização dos Estados Americanos (OEA) e Nações Unidas por considerarem que não existem condições para eleições justas, democráticas e bem observadas”.

Ainda conforme a CNN a eleição “foi marcada pelo cancelamento de três partidos políticos que faziam parte da opositora Coalizão Nacional e Aliança Cidadã, bem como a prisão de 39 líderes da oposição entre 28 de maio e 21 de outubro – sete deles aspirantes à Presidência” (1)

A União Européia e a Espanha foram fortemente críticos do processo eleitoral nicaraguense.

 

“Zombaria” e “Pantomina”

        "A UE rejeitou os resultados, comentando que as eleições "completam a conversão da Nicarágua num regime autocrático'. 

        As eleições de domingo "carecem de legitimidade" após Ortega ter eliminado toda a concorrência eleitoral credível" diz um comunicado assinado pelo chefe de política externa da UE, Josep Borrell. Todos os 27 Estados-membros do bloco acusaram o governante de "encarceramento, hostilização e intimidação sistemáticos" de oponentes, jornalistas e ativistas". 

        Madri criticou especificamente o processo eleitoral: "Foi uma zombaria, uma zombaria em relação ao povo da Nicarágua, uma zombaria em relação à comunidade internacional e, sobretudo, uma zombaria em relação à democracia" declarou o ministro espanhol do Exterior, José Manuel Albares" (2). 

        "O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, chamou as eleições presidenciais da Nicarágua de farsa, uma vez que Ortega teria garantido o quarto mandato após afastar seus adversários. 

        "O que o presidente da Nicarágua e sua mulher orquestraram hoje foi uma eleição que não foi nem livre, nem justa, e, certamente, não democrática", declarou Biden em um comunicado da Casa Branca sobre "as eleições fraudulentas na Nicarágua". (3).


Solidariedade petista

    Por outro lado o PT não perdeu oportunidade para demonstrar sua solidariedade revolucionária. Talvez porque em política externa o PT mostre mais claramente o que é...

        Na nota o PT só vê maravilhas no governo do ex-sandinista Daniel Ortega. Nada como estar apaixonado...

        Eis a nota oficial do partido do último dia 8 de novembro. 

        

Saudação às eleições nicaraguenses

O Partido dos Trabalhadores (PT) saúda as eleições nicaraguenses realizadas neste domingo, 7 de novembro.

O Partido dos Trabalhadores (PT) saúda as eleições nicaraguenses realizadas neste domingo, 7 de novembro, em uma grande manifestação popular e democrática deste país irmão.

Os resultados preliminares, que apontam para a reeleição de Daniel Ortega e Rosario Murillo, da FSLN, confirmam o apoio da população a um projeto político que tem como principal objetivo a construção de um país socialmente justo e igualitário.

Esta vitória será conquistada apesar das diversas tentativas de desestabilização do governo e do bloqueio internacional contra a Nicarágua e seu atual governo, uma situação que penaliza principalmente os mais pobres e necessitados.

Esperamos seguir com a FSLN neste caminho de construção de uma América Latina e Caribe livres e soberanos, uma região de paz e democracia social que possa servir de exemplo para todo o mundo.

Romenio Pereira
Secretário de Relações Internacionais

08 de novembro de 2021. (4).

________________

Aqui terminava meu artigo escrito ontem, dia 10. Agora cedo vi que o partido apagou a nota. Disseram que a nota não tinha sido discutida pelo partido, ou seja, Romenio Pereira foi um pouquinho precipitado... Só isso? Veja aqui o "arrependimento". https://www.gazetadopovo.com.br/republica/breves/apos-criticas-pt-apaga-nota-de-apoio-ao-ditador-daniel-ortega-da-nicaragua/


Fontes:

1.  1. https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/ortega-da-nicaragua-garante-outro-mandato-eua-ameaca-acao/

2.   2. https://www.dw.com/pt-br/em-elei%C3%A7%C3%A3o-contestada-daniel-ortega-%C3%A9-reeleito-na-nicar%C3%A1gua/a-59757171

3.     https://noticias.r7.com/internacional/eleicoes-polemicas-na-nicaragua-terminam-com-vitoria-do-governo-07112021

4.      4. https://pt.org.br/blog-secretarias/saudacao-as-eleicoes-nicaraguenses/




quinta-feira, 28 de outubro de 2021

É CRIME DE HOMOFOBIA CRITICAR O HOMOSSEXUALISMO?

 Valter de Oliveira


Declarações do jogador de vôlei Mauricio Souza, jogador de Vôlei que perdeu o emprego por haver feito críticas ao homossexualismo, provocaram enorme celeuma em toda a mídia e na sociedade.

Salvo melhor juízo penso que há uma série de equívocos no que vem sendo publicado e discutido. Daí a necessidade de entendermos claramente os seguintes pontos: 

1. Existe lei que criminaliza a homofobia?

2. Discordar da prática homossexual pode ser considerado prática criminosa?

3. Supondo que esta seja é conforme a lei que, ipso facto, o infrator perca o direito vital ao trabalho? Ele passa a ser proscrito da sociedade? 

A julgar pelos jornalistas da grande mídia, os três pontos acima são verdadeiros. Será? Vejamos.

Ponto 1. O Congresso Nacional não aprovou nenhuma lei contra a homofobia. Assim foi até junho de 2019. Aí, discutindo uma ADO (Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão) proposta pelo PSB e relatada pelo ministro Celso de Mello) - ADO 26 - o Supremo decidiu comparar a homofobia ao crime de racismo.

"A decisão do STF aprovou o voto do relator da ADO, min. Celso de Melo, elaborada em três pontos centrais:

1 – Até que o Congresso Nacional edite lei específica, condutas homofóbicas ou transfóbicas se enquadram nos crimes previstos na Lei 7.716/89,

2 – A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe o exercício da liberdade religiosa, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio.

3 – A tese estabelece que o conceito de racismo ultrapassa aspectos estritamente biológicos ou fenotípicos e alcança a negação da dignidade e da humanidade de grupos vulneráveis".

Em suma não há uma lei feita pelo Legislativo. O que temos é a ADO aprovada. De qualquer modo, mesmo que provisoriamente, tem o valor de lei.

Ponto 2. Outra questão é o alcance da ADO 26. Ela afirma que discordar da prática homossexual é crime? A resposta é simples. Não. E os ministros do STF tiveram o cuidado de explicar que a ADO respeitava o direito dos fiéis de várias religiões em considerar tal prática como pecado. Tal liberdade não é uma ofensa aos homossexuais. Vejam um texto de um artigo jurídico sobre o assunto: 

"frise-se que as igrejas continuam tendo a liberdade de ensinar sobre o pecado à luz dos seus fundamentos teológico doutrinários, desde que não profiram discurso de ódio. A reprovação da conduta homossexual ou transexual pela igreja como pecado não se torna crime, sob pena de claro atentado a um princípio e a um dispositivo constitucionais: liberdade religiosa (Art. 5º, inciso VI, CF/88). Significa que a decisão do STF não só não poderá restringir como não poderá alcançar a liberdade religiosa. Do contrário, o guardião da Constituição, contraditoriamente, violaria o imperativo constitucional. Aqui, torna-se relevante destacar o que a decisão do STF dispôs quanto ao respeito às convicções religiosas e à expressão da fé na ADO 26:

A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosaqualquer que seja a denominação confessional professa, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outrosé assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletivadesde que tais manifestações não configurem discurso de ódioassim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero”.

A Corte, mencionando a liberdade de expressão, ainda realçou que a manifestação de opiniões que gerem discordância ou, até mesmo, repúdio, por si só, não indica o cometimento de crime passível de sanção penal, sendo imprescindível que seja assegurado o respeito ao pluralismo e à tolerância. Vejamos nos termos postos pelo Supremo:

O verdadeiro sentido da proteção constitucional à liberdade de expressão consiste não apenas em garantir o direito daqueles que pensam como nósmasigualmenteem proteger o direito dos que sustentam ideias (mesmo que se cuide de ideias ou de manifestações religiosasque causem discordância ou que provoquematé mesmo, o repúdio por parte da maioria existente em uma dada coletividade. O caso “United States v. Schwimmer” (279 U.S. 644, 1929): o célebre voto vencido (“dissenting opinion”) do Justice OLIVER WENDELL HOLMES JR.. É por isso que se impõe construir espaços de liberdade, em tudo compatíveis com o sentido democrático que anima nossas instituições políticas, jurídicas e sociais, para que o pensamento – eparticularmente o pensamento religioso – não seja reprimido eo que se mostra fundamentalpara que as ideias, especialmente as de natureza confessionalpossam florescer, sem indevidas restrições, em um ambiente de plena tolerância, que, longe de sufocar opiniões divergenteslegitime a instauração do dissenso e viabilizepelo conteúdo argumentativo do discurso fundado em convicções antagônicas, a concretização de valores essenciais à configuração do Estado Democrático de Direito: o respeito ao pluralismo e à tolerância”.

 Não fica claro, pelo menos no que li, se há o direito de se criticar o homossexualismo com bases estritamente filosóficas ou científicas. Não me parece razoável que isso seja proibido. 

Ponto 3. Não sei em que ponto da ADO os defensores da ideologia LGBT se apoiam para impedir que uma pessoa tenha o direito fundamental ao trabalho. Direito que tem sido negado até a quem tem se retratado. Parece-me uma interpretação draconiana do Direito que nada tem a ver com nossa legislação. Aliás, legislação bastante leniente até em relação a graves crimes contra a pessoa humana. 

Parece que resolveram parodiar São Paulo: "Aquele que não é politicamente correto, que não coma"....

FONTE: https://anajure.org.br/homofobia-e-igreja-a-decisao-do-stf-sobre-equiparacao-de-homotransfobia-ao-crime-de-racismo-e-os-reflexos-para-a-igreja/

Nota: os destaques em negrito são do advogado que escreveu o artigo no anajure. 


 

sexta-feira, 17 de setembro de 2021

AS INCOERÊNCIAS REVOLUCIONÁRIAS

 






Valter de Oliveira

Fico pasmo com as incoerências e ilogicidades das correntes revolucionárias.

Você pode perguntar: -"Quem? Está falando da esquerda? Dos socialistas?

- Sim, dela e de seus predecessores. Iluministas, libertários, positivistas, marxistas, etc, etc. Todos, diga-se de passagem, em diferentes momentos se disseram revolucionários. São mesmo. Procuram implantar uma sociedade puramente humana, que nega o destino último do homem, e que, dentro do possível, imaginam que com tal pensamento conseguirão construir uma sociedade humana justa e solidária, fruto da evolução do mundo. A esquerda marxista, por exemplo, está sempre sonhando com um mundo novo e um homem novo. É um milenarismo político. 

Mas vamos ao ponto do artigo. Por que digo que são ilógicos e incoerentes?

Fake news e verdade

 Como todos sabemos uma das coisas mais faladas atualmente é a propagação de fake news (1). Esta passou a ser a heresia que assusta os revolucionários. Afinal, dizem, não há o direito de se propagar mentiras, falsidades. Especialmente contra eles...



Sei que eu e você, e milhões de cidadãos, de qualquer lugar do mundo, rejeitamos a mentira e a falsidade. Só que a imensa maioria não entra em discussões filosóficas sobre o assunto. Não se deve mentir! Menos ainda espalhar mentiras. E ponto final!

Eu diria que tal postura, do chamado senso comum, ou do bom senso, está conforme o direito natural. No meu caso eu diria que está de acordo com a filosofia católica, com a moral cristã. Para nós a verdade é objetiva. É o que ensina a visão aristotélica tomista. Conforme esta  algumas coisas deveriam ser proibidas. Ou, no máximo, toleradas. Exemplo: a pornografia e a prostituição. 

Mas, porém, todavia, contudo, entretanto, diversos filósofos revolucionários defendem que a verdade é subjetiva, ou relativa. Ou as duas coisas. 

Tal visão filosófica não ficou apenas nas páginas dos livros ou no coração e mentes de seus pensadores. Influenciou a política. Dominou-a. Cristalizou-se em leis. 

Qual o resultado?

Países tidos como amplamente democráticos - tidos como estados democráticos de direito - consideram que as liberdades de expressão, opinião, reunião são direitos assegurados por lei. 

Concordo. Desde que se entenda de forma adequada o que é liberdade e o que é democracia. A que sigo afirma que a liberdade não é absoluta. Ela está sempre ligada à verdade. 

Os revolucionários relativistas contemporâneos vão perguntar para mim e para você: -"Mas, o que é a verdade?". 

Tal como Pilatos eles dizem que não sabem. Também afirmam que o Estado não o sabe. O Estado não sabe o que é ética. (2)  Sendo assim, concluíram, a liberdade precisaria ser total. Pelo menos enquanto ficar no campo das ideias e das expressões. Daí que, pelo menos em alguns países, a suástica não é  proibida. Aliás, nem mesmo associações claramente nazistas são proibidas. Se pode haver propaganda de genocidas comunistas também deve ser livre a dos nazistas. 

Lembro ainda que nos países tidos como profundamente democráticos o satanismo pode ser praticado e propagado. 

Tudo isso é fruto do subjetivismo e do relativismo moral. 

Ok. Aí você entende porque não aceitariam um projeto meu, se fosse deputado federal, de proibir a pornografia. Ou que proibisse taxativamente a ideologia de gênero para crianças e adolescentes. Garanto que, se aprovasse, o STF viria correndo dizer que o texto aprovado feria a democracia e o estado democrático de direito. 

Assim é como se entende. Na maior parte do mundo laicista globalizado. Querem uma prova?

O caso Charlie Hebdo

Como é sabido o jornal francês era altamente polêmico. Abusado, pornográfico, insolente, fazia charges indignas contra muita gente. Não tiveram nenhum pejo em apresentar assim  um conclave de cardeais ou a Santíssima Trindade. Depois resolveram levar a indignidade para a seara muçulmana. O resultado foi trágico. Terroristas resolveram reagir criminosamente. E aí tivemos a tragédia que abalou a França. 

Tinham direito de fazer o que faziam? Podiam propagar tais ofensas? É direito de um grupo ofender tão dura e sacrilegamente fiéis do mundo inteiro?

Conforme minha visão de mundo, de democracia e de liberdade, não. Conforme os laicistas e relativistas do mundo inteiro, sim... (3)

Qual foi a reação?

Governantes e a quase totalidade da mídia levantou-se em peso. Milhões saíram às ruas, em todo o mundo, exclamando: "Je suis Charlie". 

A Wikipedia, neste caso 100% confiável, escreveu: "A frase "Je suis Charlie" (francês para "Eu sou Charlie") transformou-se em um sinal comum em todo o mundo, de prestar solidariedade contra os ataques e para a liberdade de expressão". [25]

 

Conclusão

Agora, ouvindo jornalistas da grande mídia, correntes políticas, ou membros do Judiciário, parece que todo mundo virou tomista. Coligaram-se libertários, sociais democratas e toda a esquerda. Toda a santidade laicista. São Tomás ficaria feliz. Mas ele sabe muito bem que por trás de pretenso amor à verdade temos um mundo de hipocrisia. 

Para todos eles podemos dizer que há coisas objetivamente más que devem ser desmascaradas, proibidas, combatidas. 

Só que aí começaram a considerar fake news o que não é. Ou melhor, algumas coisas realmente são falsas, outras não. 

Quem decide? Eles? dogmaticamente?

E como se combate fake news? Com a atuação do Judiciário?

É um caminho. Pode ser legítimo. Quem, como eu, defendo a verdade e a justiça penso que injúrias e calúnias devem ser punidas. Conforme a lei. Conforme a justiça. Respeitando-se o devido processo legal. 

E aqui entra um grande exemplo de contradição. O inquérito das fake news é arbitrário. Ele não segue nada disso. Assemelha-se a atos abusivos e autoritários permitidos no passado brasileiro. Passado que dizem abominar!

Até quando senhores revolucionários?

Notas:

1. Parece-me que o conceito de fake news ainda não está nas leis brasileiras. Se estiver enganado peço que me enviem o texto legal. 

2. Há alguns anos o governo iniciou um diálogo com pensadores católicos sobre o modo como se deveria pleitear direitos ou combater certas ideias. O governo não queria que se apelasse para o direito natural (tido por ele como muito ligado ao catolicismo) Dever-se-ia argumentar em nome do interesse coletivo. Visão pragmática revolucionária que pode levar a mil arbitrariedades jurídicas. O diálogo, que eu saiba, não teve frutos. Entrei na internet para procurar reações. O que vi foram reações furiosas de gente de segundo e terceiro escalão do governo que rejeitava até mesmo as conversas ocorridas.

3. Por amor à verdade é importante dizer que há defesas na lei contra tal tipo de injúria. O clero católico tem meios de processar todos os atos de profanação e sacrilégio  que certos manifestantes de esquerda praticam. Infelizmente ninguém se mexe.  





quarta-feira, 25 de agosto de 2021

MITOS COMUNS DAS VACINAS COVID-19 EXPLICADOS

 

 

Não, a vacina não alterará seu DNA nem fornecerá COVID-19

Mesmo que você entenda o processo científico, confie em especialistas médicos e saiba como as vacinas são importantes para combater doenças infecciosas, você ainda pode ter algumas perguntas ou preocupações sobre as novas vacinas COVID-19 - especialmente com tantos rumores circulando online.

É normal e saudável ter perguntas, diz  Thaddeus Stappenbeck, MD, PhD , Presidente do Departamento de Inflamação e Imunidade do Instituto de Pesquisa Lerner da Clínica Cleveland.

“São novas terapêuticas e é totalmente razoável fazer perguntas construtivas com a mente aberta”, garante.

Dito isso, também é importante buscar fontes confiáveis ​​de informação. Aqui, o Dr. Stappenbeck ajuda a esclarecer algumas dúvidas, preocupações e mitos comuns que surgiram sobre as vacinas COVID-19.

Mito 1: A vacina me dará COVID-19

As vacinas  preparam seu sistema imunológico  para reconhecer e combater os vírus, mas na verdade não causam uma infecção.

As vacinas Moderna e Pfizer COVID-19 contêm uma fita de material genético chamada RNA mensageiro, ou mRNA. Quando o mRNA entra em suas células, ele as instrui a fazer um pedaço da proteína “pico” que está presente no coronavírus que causa o COVID-19. Essas proteínas não prejudicam realmente o corpo, mas ativam o sistema imunológico para montar uma resposta para combatê-las.

A vacina COVID-19 da Johnson & Johnson fornece DNA que codifica a proteína spike, mas é fornecida por outro tipo de vírus que é seguro.

Você pode sentir algum cansaço, dores musculares, dor de cabeça ou febre depois de receber a vacina. Isso é normal com qualquer vacina - e é um sinal de que seu sistema imunológico está respondendo.

 

Mito 2: Não podemos confiar nas vacinas COVID-19 porque elas foram apressadas

As primeiras vacinas do COVID-19 envolvem novas tecnologias e foram desenvolvidas em tempo recorde. Mas não é porque havia atalhos no processo.

Novamente, o RNA mensageiro, ou mRNA, é a nova tecnologia no centro das vacinas COVID-19 da Pfizer e Moderna. Embora esta seja a primeira vez que está sendo amplamente usada em uma vacina para o público, os pesquisadores, na verdade, vêm trabalhando nessa estratégia de vacina há mais de  três décadas .

“Foi uma sorte que a tecnologia tenha sido desenvolvida de forma robusta e bastante bem nos últimos anos e testada em vários modelos animais de infecção, então sabíamos que era segura e funcionava muito bem nesses modelos animais”, diz o Dr. Stappenbeck . “Quando o COVID-19 surgiu, esta era uma oportunidade óbvia de usar essa nova tecnologia, e os desenvolvedores de vacinas estavam prontos para fazê-lo.”

As empresas submetem suas vacinas a testes clínicos rigorosos envolvendo dezenas de milhares de voluntários. Nos Estados Unidos, a Food and Drug Administration exige que eles acompanhem os voluntários por até dois anos após receberem as vacinas para se certificar de que são seguras e eficazes. Devido à prevalência de COVID-19, levou apenas alguns meses para os ensaios clínicos coletarem dados suficientes para fazer uma avaliação inicial.

O FDA e um painel independente de especialistas em vacinas examinaram de perto os dados desses testes e consideraram as vacinas da Pfizer e da Moderna  seguras e eficazes  para uso de emergência (e a vacina da Pfizer agora recebeu total aprovação da FDA). Painéis independentes semelhantes em vários outros países estão de acordo.

 

Mito 3: não sabemos o que há nessas vacinas

Todos os três fabricantes de vacinas dos EUA publicaram as listas de ingredientes para suas vacinas, disponíveis em seus sites. O site do CDC também informa o que há nas vacinas COVID-19 .

O ingrediente estrela é o mRNA COVID-19 (em Modern e Pfizer) ou DNA (em Johnson & Johnson) para a proteína spike. Ambas as vacinas também contêm lipídios (gorduras) que ajudam a entregar o mRNA em suas células e alguns outros ingredientes comuns que ajudam a manter o pH e a estabilidade da vacina.

Apesar de teorias circularem nas redes sociais, nenhuma das vacinas COVID-19 contém microchips ou qualquer forma de dispositivo de rastreamento.

 

Mito 4: Essas vacinas vão alterar meu DNA

Este mito é especialmente direcionado às vacinas Pfizer e Moderna - mas o ponto principal é que nenhuma das vacinas COVID-19 pode alterar seu DNA.

Ambas as vacinas usam mRNA para instruir nossas células a fazer um pedaço da proteína de pico característica do coronavírus para desencadear uma resposta do sistema imunológico. Depois que o mRNA faz isso, nossas células o decompõem e se livram dele.

“O RNA mensageiro é algo feito de DNA, mas não foi projetado para se integrar ao nosso DNA e não muda permanentemente nosso genoma e quem somos de forma alguma”, diz o Dr. Stappenbeck.

 

Mito 5: Eu já tinha COVID-19, então não vou me beneficiar com a vacina

É muito possível obter o COVID-19 mais de uma vez . A imunidade do seu corpo contra infecções diminui com o tempo, então os anticorpos que ele criou quando você se recuperou do coronavírus não o protegerão de reinfecção a longo prazo.

 

Mas a vacinação pode. Dados indicam que a vacina oferece proteção mais longa do que a infecção natural, mostrando que pessoas não vacinadas têm 2,34 vezes mais probabilidade de serem reinfectadas com COVID-19 do que aquelas totalmente vacinadas.

Até agora, casos de avanço são possíveis, mas um tanto incomuns, particularmente em pessoas vacinadas que se recuperaram do vírus. Mas isso está mudando rapidamente, à medida que a porcentagem de casos inovadores está aumentando para uma taxa mais alta do que o previsto. Uma terceira vacinação pode ser necessária.

 

Mito 6: como a taxa de sobrevivência de COVID-19 é tão alta, não preciso de vacina

É verdade que a maioria das pessoas que recebem COVID-19 pode se recuperar. Mas também é verdade que algumas pessoas desenvolvem complicações graves.

A Organização Mundial da Saúde relata que até agora, cerca de 4,4 milhões de pessoas em todo o mundo morreram de COVID-19 - e isso não leva em conta as pessoas que sobreviveram, mas precisaram ser hospitalizadas. Como a doença pode danificar os pulmões, o coração e o cérebro, ela também pode causar problemas de saúde de longo prazo que os especialistas ainda estão trabalhando para entender.

Há outra razão para tomar a vacina: ela protege outras pessoas. Mesmo que o COVID-19 não o deixe muito doente, você pode passá-lo para outra pessoa que possa ser mais gravemente afetada. A vacinação generalizada protege as populações, incluindo aquelas que estão em maior risco e aquelas que não podem ser vacinadas.

 

Mito 7: A vacina causa infertilidade

Como as vacinas COVID-19 não contêm o vírus vivo (lembre-se, é uma vacina de mRNA), não se acredita que causem um risco aumentado de infertilidade, perda no primeiro ou segundo trimestre, natimorto ou anomalias congênitas. Além disso, não há evidências que sugiram que a vacina seja um risco para o bebê que amamenta.

Os médicos acreditam que é seguro tomar a vacina COVID-19 se você estiver grávida , e o CDC incentiva fortemente as pessoas grávidas (e aquelas que desejam engravidar) a receber a vacina COVID-19.

 

Mito 8: Eu sou vacinado, então não preciso usar máscara ou distância social

Mesmo após a vacinação, você deve continuar a usar máscara perto das outras pessoas, lavar as mãos e praticar o distanciamento físico. Existem algumas razões para isso.

 

A primeira é que ambas as vacinas autorizadas requerem duas doses administradas com três a quatro semanas de intervalo para atingir a melhor imunidade possível. Quando você toma sua primeira dose,  você não se torna imediatamente imune.

“Leva pelo menos uma semana a 10 dias para que seu corpo comece a desenvolver anticorpos, e então esses anticorpos continuam a aumentar nas próximas semanas”, diz o Dr. Stappenbeck.

A segunda razão é que essas vacinas foram desenvolvidas e testadas quanto à sua capacidade de prevenir doenças graves e morte por COVID-19 - mas podem não proteger contra  infecções assintomáticas  e disseminação.

 

Mito 9: agora que temos vacinas, a pandemia acabará em breve

“Eu adoraria dizer que vamos apertar um botão e tudo voltará ao normal, mas na verdade vai levar muito tempo”, diz o Dr. Stappenbeck.

Para alcançar o que é chamado de imunidade de rebanho - o ponto em que a doença não tem mais probabilidade de se espalhar - cerca de 85% da população precisará ter sido vacinada ou infectada, diz ele. Mas a hesitação na aplicação  contínua da vacina , entre outros problemas, diminuiu nossas chances de chegar a esse ponto.

O CDC relata que cerca de 57% da população total dos EUA foi totalmente vacinada e as taxas de vacinação diminuíram. Nesse ínterim, o vírus continua a sofrer mutações e novas variantes - incluindo a variante delta que é dominante em todo o mundo - continuam a causar estragos na população não vacinada, incluindo crianças.

“Por enquanto, todos nós, incluindo as pessoas vacinadas, devemos continuar a ajudar a retardar a propagação do vírus, incluindo o uso de máscara, a lavagem das mãos e o distanciamento físico”, diz o Dr. Stappenbeck.

 

FONTE: https://health.clevelandclinic.org/common-covid-19-vaccine-myths-explained/?fbclid=IwAR1HrQQ8tCaPHVNyTNMFyjSzn4DDN_AkZtiwxBouUGBxlGctzkflS0neZhA

sexta-feira, 28 de maio de 2021

DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA 19: A RERUM NOVARUM E O DIREITO DE PROPRIEDADE

 Valter de Oliveira

Na encíclica Rerum Novarum de 1891 o Papa Leão XIII analisou efeitos negativos tanto da Revolução Industrial quanto do capitalismo da época. Também tratou do socialismo que se apresentava como solução para os graves problemas sociais surgidos. Era a famosa Questão Social. Nos meios intelectuais católicos havia quem desejasse que o Papa condenasse ambos os sistemas econômicos. Os membros da União de Friburgo, concretamente, tinham pedido "uma condenação do Capitalismo enquanto tal". (1) ) Isso não aconteceu. Aliás, na encíclica o termo não aparece. Leão XIII só fala dos capitalistas, olhados como classe social, mas não trata do capitalismo  "numa perspectiva econômica"

Ao condenar o socialismo o Papa defende a propriedade. Ela é considerada o centro da polémica com o socialismo. 

Sobre a utilidade e as vantagens da propriedade Leão XIII afirma, resumidamente: 

- A propriedade privada é exigida pela natureza do homem enquanto ser racional, principal agente da produção e chefe de família;

- A propriedade particular é uma exigência da ordem social;

Explicando melhor: 

1. A propriedade privada como exigência da natureza humana.

1.1. É Direito do homem racional e livre

Costumamos dizer que "o homem é um animal racional". Como todos os animais tem necessidades materiais, "porque é corpo ao mesmo tempo que espírito. O animal, guiado por seus instintos, contenta-se em fazer suas necessidades imediatas; o homem, guiado pela razão, conhece e tem conta das necessidades futuras; para subsistir apropria-se de bens que lhe assegurarão os dias de amanhã, isto é, dos bens de produção" (2).  

No início da humanidade podemos imaginar a ação de um homem diante da natureza. Há frutos nas árvores, peixes nas águas, animais em vários lugares. De quem são? De ninguém. O homem, para os obter precisa trabalhar. Ao pegá-los deixam de ser comuns e passam a ser seus. Por que? Porque passaram a ser fruto de seu trabalho. Este está na raiz do direito de propriedade.

Com o tempo o homem percebeu que era mais conveniente parar em algum lugar e lavrar o solo. Este não era de ninguém. Depois, com o trabalho nele desenvolvido passou a ser de uma família, de um grupo, de uma tribo. Nasceu a propriedade da terra. 

A encíclica considera que "o Estado Providência, (tal como entendido pelo socialismo revolucionário), não tem direito de chamar a si esta função de previsão pessoal e consciente sem a qual o homem seria frustrado de suas mais nobres faculdades, reduzindo-se a uma condição servil . Na prática, como sabemos, foi exatamente o que aconteceu nos kolkhozes soviéticos. 

Em suma, "O homem, ser racional, consciente e responsável pelo seu futuro, tem o direito de apropriar-se não só dos bens de consumo (frutos, animais) como também de bens de produção (da terra, etc.) em vista de suas necessidades futuras.  

1.2. O homem tem direito aos frutos do seu trabalho. 

Deus criou o homem para que este desse glória a Ele, desenvolvesse uma civilização, embelezasse a natureza. Ora, este dois últimos pontos, especificamente, dependem do trabalho. Por isso S. Josemaría Escrivá lembra que Deus nos colocou na terra para que trabalhássemos. Ao atuar conforme o plano de Deus fazemos Sua vontade e desenvolvemos nossa personalidade. Ora, o que é produzido pelo homem cabe, evidentemente, ao produtor. Daí dizer Leão XIII na RN: "Do mesmo modo que o efeito segue à causa é justo que o fruto do trabalho retorne ao trabalhador". Sempre? Não. Quando o homem trabalha usando bens alheios (o capital que na verdade é trabalho condensado, acumulado) o produto caberá em parte ao proprietário dos bens e em parte ao trabalhador. Daí surge o problema da repartição entre o que fornece o trabalho e o que entra com o capital. Tudo isso, é claro, desde que se leve em conta a legitimidade dos bens produzidos. Ademais , "o coletivismo priva o trabalhador do direito de apropriar-se dos frutos do seu trabalho. Torna, assim, mais precária a situação do trabalhador". Como vimos no sistema soviético e no chamado socialismo real expropriador "torna mais precária a situação do trabalhador, subtraindo-lhe a livre disposição de seu salário e privando-o de esperança (e estímulo) e possibilidade de assegurar um patrimônio e melhorar sua situação" (3)  (Van Gestel, p.179-180). 

1.3. A propriedade é direito do chefe de família.

Cada um de nós tem direito a fundar uma família. Ao fazermos isso assumimos  "responsabilidade mais graves para o futuro. Temos que pensar na manutenção e educação dos filhos e queremos mais que o necessário para vivermos. Pensamos em uma poupança, em bens para deixarmos para nossos filhos. É nisto que está fundado o direito de herança. É natural. O direito de propriedade é um direito natural. Diz Renard, R,G, em sua obra L'Eglise et la Question Sociale (Paris, 1937, p. 137-138:  (...) "do mesmo modo que nossa natureza animal tende ao alimento; o apetite da propriedade é tão natural à nossa espécie como a fome ou a sede, apenas estes são apetites de nossa natureza inferior e aqueles de natureza superior; todo homem tem alma de proprietário, mesmo os que se julgam inimigos da propriedade: é o que se quer dizer ao afirmar ser a propriedade de direito natural" Citado por  Van Gestel, op. cit. p. 181.

Nesta lógica é que devemos entender a declaração do Papa Pio XII quando diz: "Segundo a Rerum Novarum, a sociedade humana, o progresso da civilização, por uma exigência da própria natureza, não podem existir sem a propriedade privada. Sem ela, e com maior razão, é impensável a existência e o desenvolvimento da família" 

Sendo assim, continua ele, "todas as disposições públicas pelos quais o Estado a regula devem, não só  torná-la acessível e defende-la, mas ainda aperfeiçoar-lhe cada vez mais o exercício" (4).

Interessante ver a profunda relação entre liberdade humana, personalização, propriedade e família. Engels também ressaltou isso ao escrever sobre o assunto sob a ótica marxista. Conforme ele seria preciso destruir as duas instituições. Ambas seriam obstáculos ao socialismo tão desejado. 

No próximo artigo iremos ver a importância da propriedade privada para a ordem social. 

Notas e bibliografia:

1, AUBERT, Roger, & SCHOOYANS, Michel. Da Rerum Novarum à Centesimus Annus. São Paulo, Loyola, 1993, p. 26

2. GESTEL.O.P. Van - A Igreja e a Questão Social. São Paulo, Livraria Agir Editora, 1956, p. 179. 

3. GESTEL. p.179-180

4. GESTEL, P. 183. 



quinta-feira, 27 de maio de 2021

DOUTRINA SOCIAL DA IGREJA -18 -


SÃO TOMÁS DE AQUINO E A PROPRIEDADE

 

Valter de Oliveira

 

São Tomás discute a questão da propriedade no seu Tratado sobre a Justiça. É nele que o grande santo discute a justiça comutativa e a justiça distributiva.

Pela justiça comutativa definimos o direito de uma pessoa em relação a outra. Um contrato faz parte dela. Através deste discutimos o que é um justo salário, um justo preço ou um justo lucro. Em suma vemos o que é justo ou injusto em relação a um outro. É um sistema de trocas.

Já a justiça distributiva define o “direito de cada pessoa em relação ao conjunto dos que possuem bens não necessários”. Talvez possa se dizer, não tenho certeza, o direito em relação à sociedade. Assim, afirmam Pierre Bigo e Fernando de Ávila, na obra “Fé Cristã e Compromisso Social: “Um pobre não tem direito sobre os bens de determinado rico. Um rico não tem obrigações com relação a determinado pobre. Porém a justiça distributiva cria direitos e obrigações tão estritos como os fundados na justiça comutativa: direito do conjunto dos pobres em relação aos ricos; obrigações do conjunto dos ricos em relação ao conjunto dos pobres” (1).

É bom lembrarmos que na visão católica acima das justiças mencionadas está a chamada justiça geral que tem como fim o bem comum. Dizem os dois autores citados: “ “Ela é a norma que regula a sociedade humana e a vida comum” Santo Tomás de Aquino a chama também justiça legal, porque é por intermédio da lei que normalmente o bem comum é realizado numa sociedade” (p.171).

Fica a pergunta: quando a lei é justa ou injusta?

“na medida em que ou promove o bem comum ou o compromete. A justiça legal tem grande importância, de vez que define todos os direitos e deveres das pessoas na sociedade. É uma virtude geral, porque todos os atos do homem têm um aspecto social e, portanto, estão submetidos à justiça”

Daí “Santo Tomás aplica estes princípios à sociedade. À pergunta: “se alguém é permitido possuir alguma coisa como própria? O Doutor da Igreja não dá apenas uma resposta afirmativa. Responde com uma distinção famosa. Se se chama a propriedade a faculdade de administrar, facultas procurandi, ou de dispensar, facultas dispensandi, os bens são comuns e aquele que os possui deve cede-los facilmente aos que necessitam”

Bigo e Ávila continuam:

“Os bens são de um, mas são para todos. Depois de satisfazer a suas verdadeiras necessidades, o proprietário deve aos demais os bens que lhe sobram, avaliando sempre suas próprias necessidades. (...) o supérfluo é devido aos pobres”

Dito isso os autores reconhecem: “o termo porém é perigoso, de vez que quase nunca se encontra alguém que julgue supérfluo um bem próprio (2). A questão é realmente complexa. Como conciliar uma coisa com outra?

São Tomás vai resolve-la. “Ele intuiu que a apropriação individual não contraria mas complementa a communio bonorum, a comunhão dos bens, a apropriação social em sua destinação universal a todos os homens. Ele parte da observação que a comunidade primitiva dos bens era puramente negativa. Tudo era de todos porque nada era de alguém:

            “A comunidade dos bens é atribuída ao direito natural não no sentido de que o direito natural prescreva que tudo deve ser possuído em comum e nada seja possuído como próprio, mas no sentido de que, segundo o direito natural, não existe distinção de posses, que é o direito resultado da convenção dos homens, o que se origina do direito positivo (3). Daí se conclui que a apropriação individual não é contrária ao direito natural, mas o amplia por intervenção da razão humana” (4). 

Mais à frente os autores afirmam que a contribuição de S. Tomás obteve uma síntese luminosa com o pensamento patrístico. “Ele intuiu que a apropriação individual não contraria mas complementa a communio bonorum , a comunhão dos bens, a apropriação social em sua destinação universal a todos os homens. Parte da observação que a comunidade primitiva dos bens era puramente negativa. Tudo era de todos, simplesmente porque nada era de alguém:

            “A comunidade dos bens é atribuída ao direito natural não no sentido de que o direito natural prescreva que tudo deva ser possuído em comum e nada seja postulado como próprio, mas no sentido de que, segundo o direito natural, não existe distinção de posses, que é o resultado da convenção entre os homens, o que se origina no direito positivo. Daí se conclui que a apropriação individual não é contrária ao direito natural, mas o amplia por invenção da razão humana” (Summa Theologica, IIa-IIae, questio 66, art2, ad 1) (5).

Tanto na Idade Moderna quanto na Contemporânea grandes pensadores católicos e papas vão se ocupar da questão da propriedade tendo em vista as grandes transformações econômicas e sociais que sofreu a sociedade bem como novos sistemas econômicos e regimes políticos. A influência de todos eles vai contribuir fortemente pelo que chamamos hoje de Doutrina Social da Igreja.

Um tema de grande importância em nossos dias é ver se há possibilidade de conciliação entre o pensamento tomista e a existência de uma economia de mercado.

É o que veremos em outros artigos (6).

 

Notas:

1.    BIGO, Pierre, ÁVILA, Fernando Bastos. Fé Cristá e Compromisso Social. Elementos para uma reflexão sobre a América Latina à luz da Doutrina Social da Igreja. 2ª ed. revista e aumentada. São Paulo, Paulinas, 1983, p. 171. Bigo e Ávila são historiadores jesuítas.

2. Op. cit. p. 171.  Creio que para a maioria das pessoas a questão é realmente complexa. Temos dificuldades em ver como conciliar o ensinamento com a prática. Digamos que eu já tenha mais do que o necessário para uma vida até cômoda. Tenho o direito de fazer uma poupança para começar um negócio ou devo dá-la aos pobres? Aparentemente, se seguirmos ao pé da letra a recomendação ficaria inviabilizado uma série de investimentos na sociedade. Ora, investimentos exigem poupança e, aplicados produtivamente geram empregos. Consequentemente diminui o número de pobres elevando o  padrão de vida de todos. Tudo isso será abordado e aprofundado na Doutrina Social da Igreja.  

3. Direito positivo é todo o direito escrito pelos homens. Conforme a visão religiosa cristã os mandamentos fazem parte da lei divino-positiva já que foram escritos e dados por Deus a Moisés. Tendo tudo isso em vista a filosofia católica também ensina que as leis humanas não são absolutas; elas devem ser conformes à lei natural e às leis divino-positivas. Fato negado por todas as ideologias laicistas. Conforme estas as leis são apenas a expressão da vontade popular ou dos governantes.

4. Op.cit. p. 172,173.

5. Op. cit. 172,173.

6. Uma observação sobre este ponto, antecipando o que vamos apresentar mais tarde: Um amigo pessoal meu, Ubiratan Jorge Iório, defende que uma economia de mercado é conforme o pensamento católico, em especial levando-se em conta as contribuições da chamada escolástica tardia. Outro amigo, de FB, André Borges Uliano, que ainda não tive a alegria de conhecer pessoalmente, escreveu excelente artigo sobre o assunto.  É texto claro e profundo que merece ser lido por  quem queira aprofundar o estudo da doutrina social da Igreja. O título é “A Doutrina Social da Igreja Católica e a teoria do Livre Mercado: Pontos de Convergência”. Ver no link:

file:///C:/Users/user/Downloads/1129-Article%20Text-2785-3-10-20190906.pdf

sexta-feira, 21 de maio de 2021

O DIREITO DE PROPRIEDADE E A RERUM NOVARUM

 

Valter de Oliveira

                  

A doutrina da encíclica Rerum Novarum, de Leão XIII sobre a propriedade constitui, diz (o historiador da Igreja) Ildefonso Camacho, o centro da polêmica com o socialismo. Ele não é defendido, porém, como um direito absoluto. Aqui o Papa rejeita a concepção romana de propriedade (1) bem como a concepção liberal. Leão XIII afirma o direito de propriedade e formula vários inconvenientes que adviriam de sua eliminação como preconizada pelos socialistas. São os seguintes:

                       Primeiro inconveniente: prejudica os próprios operários.

                      Segundo inconveniente: é uma injustiça porque a propriedade privada é de direito natural.

                      Terceiro inconveniente: é contrária à função do Estado.

                      Quarto inconveniente: perturba a paz social.

                        Sem dúvida  alguma o argumento mais forte em defesa da propriedade é que ela é um direito que decorre da natureza humana.  Baseando-se no caráter previdente do homem, como ser dotado de razão (RN 5) , e no trabalho como capacidade de tornar a terra produtiva e de transformar os bens materiais (RN 7)                


Ildefonso Camacho

A doutrina pontifícia sobre a propriedade é um dos pilares da nova ordem social proposta pela Rerum Novarum. Ela é complexa, diz Camacho. E por quê? Porque se de um lado se afasta do liberalismo de outro, sustenta ele, sofre a influência dessa ideologia. (cf. Camacho, op. cit. p. 63 e 64). A argumentação em favor da propriedade como direito natural (RN 6 a 8) teria um “tom fortemente individualista”.

                        “... O ponto de partida é o indivíduo (...) os direitos da pessoa ficam determinados antes de sua incorporação à vida social. Não é arriscado identificar aqui a marca do pensamento liberal, com toda a sua carga de individualismo.” E continua:

                        “Ao acentuar-se o aspecto individual, fica em segundo plano outro elemento bastante arraigado na mais antiga tradição da Igreja, elemento que se sobrepunha à propriedade privada como um princípio de importância superior: o destino universal dos bens.  Não que este ponto tenha desaparecido na Rerum Novarum. Dele resta um vestígio, em forma de objeção, quando se diz que a propriedade privada não contradiz o princípio segundo o qual Deus deu a terra à totalidade do gênero humano, para dela usufruir e desfrutar (RN 6).” (2)

                        No que, então, a encíclica inova? No que se afasta do liberalismo?

                        Afasta-se quando o Papa insiste nos deveres da condição de proprietários e quando se concentra nas obrigações do Estado.

                        Se a propriedade é natural ao homem nem por isso, já o dissemos, é um direito absoluto. Ao usá-las, diz o Papa, “o homem não deve considerar as coisas como próprias, e sim como comuns” (RN l6). E os bens que recebemos “para aperfeiçoamento próprio” devem ser usados “em benefício dos outros”. (RN 14). Este ponto, depois da Rerum Novarum, é cada vez mais claro na doutrina social da Igreja.

                        E qual o papel do Estado em relação à propriedade? É duplo.

                        Em primeiro lugar deve “garantir a posse privada com o império e a ajuda das leis” (RN 28). É o dever do Estado de proteger os direitos individuais. E com a Rerum Novarum fica claro que ele deve defender principalmente os mais fracos.

                        Em segundo lugar o Estado deve contribuir para a difusão da propriedade. É natural. Se todos têm direito a  propriedade é preciso que seu acesso seja facilitado a todas as classes, a todos os grupos sociais. Para isso é necessário que o operário tenha um salário suficiente, salário que lhe permita uma poupança, e que lhe permita adquirir um pequeno patrimônio ( RN 33).

                        A Rerum Novarum não fala – já o mencionamos – em propriedade privada dos meios de produção. Não há dúvida, porém, que implicitamente a admite. É o que pode ser comprovado, por exemplo, com a seguinte passagem: “Intervenha, portanto, a autoridade do Estado, e, reprimindo os agitadores, preserve os bons operários do perigo da sedução e os legítimos patrões de serem despojados do que é seu” (RN 23).-3.


Observação: o texto é um excerto de minha dissertação "Evolução da Doutrina Social da Igreja. Histórico do pensamento dos Papas e dos Bispos do Brasil de Leão XIII a Pio XII em relação à Questão Social, ao Capitalismo e ao Socialismo" apresentado no Departamento de História da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP em 2001. Orientador: Dr. Augustin Wernet. 

1. No Direito Romano se diz que a propriedade é um direito de uso e abuso sobre o bem possuído. Já na concepção católica somos administradores dos bens de Deus. Não há direito ao abuso. Se tenho um bem e não o quero mais o correto não é destruí-lo, é vende-lo ou dá-lo a quem possa fazer bom uso dele. 

2 - CAMACHO. Ildefonso. Doutrina Social da Igreja. Uma Abordagem Histórica. São Paulo, Loyola, 1995, p. 63.

3. O que é claramente explicitado nas encíclicas sociais posteriores.