domingo, 4 de novembro de 2018

A IGREJA E OS SOCIALISMOS II. 1937-1991 O erro essencial do socialismo











Valter de Oliveira

Começo relembrando o que Pio XI disse na Quadragesimo Anno: O socialismo “tem uma natureza essencialmente anticristã”. E completa: “pois concebe a sociedade de modo completamente avesso à verdade cristã”.
É fácil entender? Suponho que não. Primeiro porque são poucos os católicos que entendem o que seria uma sociedade conforme a concepção cristã ou, se quiserem, conforme o plano de Deus na história (1). Segundo porque há quem imagine que basta colocar um rótulo cristão no socialismo para que o conteúdo passe a ser católico. Brutal engano. Terceiro porque, em concreto, por exemplo na realidade brasileira, temos partidos socialistas que não esclarecem que socialismo defendem. Fala-se até em socialismo cristão. Na última eleição para o governo de São Paulo, por exemplo, muita gente se perguntou se não seria melhor  votar no França e não no Doria. Obviamente, isso não é uma questão moral para a maior parte dos eleitores mas pode ser problema para quem procura levar a sério a Doutrina Social Católica.
Dito isso voltemos à análise do socialismo.
Papa João Paulo II
João Paulo II, na Centesimus Annus, elogia Leão XIII por sua “extraordinária lucidez na apreensão, em toda sua crueza, da verdadeira condição dos  proletários, homens, mulheres e crianças; por outro lado a não menor clareza com que intuiu o  o mal de uma solução que, sob a aparência de uma inversão de pobres e ricos, redundava de fato em detrimento daqueles mesmos que se propunha ajudar. O remédio revelar-se-ia pior que a doença. (...) CA 12
Leão XIII tinha antevisto o que seria o mal do socialismo “como sistema de Estado: aquele que tomaria o nome de “socialismo real”. A história provou que ele acertara.
Relacionando o que Leão XIII dissera na RN com encíclicas que escrevera anteriormente João Paulo II (Laborens Exercens e Sollicitudo Rei Socialis) aprofunda a questão do erro socialista:
“(...) é preciso acrescentar que o erro fundamental do socialismo é de carácter antropológico. De facto, ele considera cada homem simplesmente como um elemento e uma molécula do organismo social, de tal modo que o bem do indivíduo aparece totalmente subordinado ao funcionamento do mecanismo econômico-social, enquanto, por outro lado, defende que esse mesmo bem se pode realizar prescindindo da livre opção, da sua única e exclusiva decisão responsável em face do bem ou do mal. O homem é reduzido a uma série de relações sociais, e desaparece o conceito de pessoa como sujeito autônomo de decisão moral, que constrói, através dessa decisão, o ordenamento social. Desta errada concepção da pessoa, deriva a distorção do direito, que define o âmbito do exercício da liberdade, bem como a oposição à propriedade privada. O homem, de fato, privado de algo que possa «dizer seu» e da possibilidade de ganhar com que viver por sua iniciativa, acaba por depender da máquina social e daqueles que a controlam, o que lhe torna muito mais difícil reconhecer a sua dignidade de pessoa e impede o caminho para a constituição de uma autêntica comunidade humana.

Pelo contrário, da concepção cristã da pessoa segue-se necessariamente uma justa visão da sociedade. Segundo a Rerum novarum e toda a doutrina social da Igreja, a sociabilidade do homem não se esgota no Estado, mas realiza-se em diversos aglomerados intermédios, desde a família até aos grupos econômicos, sociais, políticos e culturais, os quais, provenientes da própria natureza humana, estão dotados — subordinando-se sempre ao bem comum — da sua própria autonomia. É o que designei de «subjetividade» da sociedade, que foi anulada pelo «socialismo real» 

Se se questiona ulteriormente onde nasce aquela errada concepção da natureza da pessoa e da subjetividade da sociedade, é necessário responder que a sua causa primeira é o ateísmo. É na resposta ao apelo de Deus, contido no ser das coisas, que o homem toma consciência da sua dignidade transcendente. Cada homem deve dar esta resposta, na qual se encontra o clímax da sua humanidade, e nenhum mecanismo social ou sujeito coletivo o pode substituir. A negação de Deus priva a pessoa do seu fundamento e consequentemente induz a reorganizar a ordem social, prescindido da dignidade e responsabilidade da pessoa.

O referido ateísmo está, aliás, estritamente conexo com o racionalismo iluminista, que concebe a realidade humana e social do homem, de maneira mecanicista. Nega-se deste modo a intuição última sobre a verdadeira grandeza do homem, a sua transcendência relativamente ao mundo das coisas, a contradição que percebe no seu coração entre o desejo de uma plenitude de bem e a própria incapacidade de o conseguir e, sobretudo, a necessidade da salvação que daí deriva (Centesimus Annus, 13)

Aqui está a doutrina. Convém entender melhor seus pontos principais. Depois, cabe a nós vermos na prática, nos programas dos partidos políticos, nas políticas públicas, na pedagogia educacional, se o que é proposto é ou não conforme a doutrina católica. Querem tentar tomando como exemplo o que defende o PT? É um bom exercício.

Notas:
1.    Conforme a teologia Deus teve um plano ao criar a humanidade. Cada um de nós é único e chamado para ser fiel ao que se pede de nós. É também nosso dever construir uma sociedade humana o quanto possível perfeita.

A IGREJA E OS SOCIALISMOS 1891-1937














Valter de Oliveira

Em 1891 o Papa Leão XIII lançou a famosa encíclica Rerum Novarum na qual a Igreja tomava posição diante de um processo histórico que atingia então, um ponto nevrálgico. No campo político, diz João Paulo II, surgira “uma nova concepção da sociedade e do Estado e, consequentemente, da autoridade”. No campo econômico, e com a Revolução Industrial, o capitalismo nascente havia provocado a famosa “Questão Social” com o conflito entre o capital e o trabalho (Centesimus Annus ) com as consequentes injustiças em relação aos operários. Naturalmente surgiram reações e propostas para solucionar o problema. De um lado os movimentos socialistas, de outro os católicos sociais (1).  

Papa Leão XIII
Leão XIII tem palavras duras contra o liberalismo econômico e político, seja porque os operários tinham perdido o direito de se organizar para se defender, seja porque o Estado os tinha abandonado à própria sorte. Ora, diante desse fato, perguntou-se: o socialismo seria uma opção justa e legítima diante do chamado “capitalismo selvagem”? Não, disse Leão XIII. “Os socialistas, para curar este mal, (a questão operária) instigam nos pobres o ódio invejoso contra os que possuem” (RN 7) Suas ideias, acrescenta, não iriam ajudar os pobres. (...) “Semelhante teoria, longe de por termo ao conflito, prejudicaria o operário se fosse posta em prática. Outrossim, é sumamente injusta, por violar os direitos legítimos dos proprietários, viciar as funções do Estado e tender para a subversão completa da ordem social” (RN 8).

O socialismo aqui condenado é aquele que defendia a abolição da  propriedade privada dos meios de produção, em que os bens passariam a ser comuns, em que o Estado viria a ser o grande administrador da economia. Na época era apenas uma doutrina, um movimento, cujo ideal só foi colocado em prática, pela primeira vez, com a sangrenta revolução bolchevista russa de 1917.  A partir daí a Igreja não vai enfrentar apenas doutrinas nefastas. Vai ter que se defrontar com a concretização delas, com governos brutais, totalitários. Inicialmente o comunista, depois o totalitarismo nazifascista. A todos condenou em suas encíclicas (2). Por todos foi perseguida. Milhares de católicos fiéis foram despojados de seus direitos e até martirizados.

Contudo, já no final do século XIX surgiram novos socialismos chamados pós marxistas. Nasceu o socialismo revisionista. Foram negados pontos importantes da doutrina do velho Marx. O objetivo passou a ser melhorar o sistema vigente e não preparar uma revolução. Criticou a teoria e a prática canalizando o ímpeto revolucionário para uma política realista (realpolitik)  (3).

Lembremos também que na evolução dos socialismos tivemos o surgimento da social democracia que nasce do marxismo mas vai colaborar para o surgimento dos Estados de bem estar social. Em partidos com tal bandeira não se fala mais do socialismo defendido por Marx. Mesmo assim, diz o historiador Paul Hugon, a ideia da propriedade coletiva ainda encontra partidários, mas é mais uma esperança do que a crença que um dia será alcançada (4).

O resultado é que novos socialismos surgiram. Alguns até considerados bem humanistas e até religiosos (5).

Com todas essas mudanças era natural que se perguntasse se já aparecera um socialismo bom, um socialismo que pudesse ser apoiado pelos católicos. Eis o que diz Pio XI na “Quadragésimo Anno”:

Papa Pio XI
"E se o socialismo estiver tão moderado no tocante a luta de classes e a propriedade particular, que já não mereça nisto a mínima censura? Terá renunciado por isso a sua natureza essencialmente anticristã? (...) Para lhes respondermos, como pede a Nossa paterna solicitude, declaramos: o socialismo, quer se considere como doutrina, quer como fato histórico, ou como "ação", se é verdadeiro socialismo, mesmo depois de se aproximar da verdade e da justiça nos pontos sobreditos, não pode conciliar-se com a doutrina católica, pois concebe a sociedade de modo completamente avesso a verdade cristã. (...) " (QA 117 e 120)
"Socialismo religioso, socialismo cristão, são termos contraditórios: ninguém pode ao mesmo tempo ser bom católico e socialista verdadeiro" (QA 119) (Destaque nosso).
Isso foi dito há 87 anos. De lá para cá o socialismo foi adquirindo novas nuances. Será que já não houve uma mudança substancial que nos autorize a apoiá-lo ou sua natureza, como disse o Papa, continua “essencialmente anticristã”? Quem nos responde é João Paulo II na encíclica Centesimus Annus. É o que veremos na segunda parte do artigo.

Notas e bibliografia
1.    Dá-se o nome de católicos sociais aos intelectuais católicos do século XIX – do clero e do laicato – que procuraram uma alternativa para a questão social tendo como base os princípios católicos sobre a sociedade. .
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2.    São todas encíclicas do Papa Pio XI
MIT BRENNENDER SORGE, de 14 de março de 1937. Condena o nazismo.
DIVINI REDEMPTORIS, de 19 de março de 1937, que condena o comunismo marxista.
NOS ES MUY,  de 28 de março de 1937, endereçada aos bispos mexicanos
NON ABIAMO BISOGNO, de 29 de junho de 1931. Sobre o fascismo e a Ação Católica.
3.    HUGON, Paul. História das Doutrinas Econômicas,14 ed. São Paulo, Atlas, p. 247.

4.    Exemplos de socialismo: Socialismo Fabiano, socialismo cultural, socialismo educacional, socialismo religioso, socialismo personalista, socialismo democrata. Os chineses dizem que adotam agora um socialismo de mercado.  


Enciclicas citadas

Rerum Novarum (RN). Leão XIII – 1891

Quadragesimo Anno (QA). Sobre a Restauração e Aperfeiçoamento da Ordem Social. 40º aniversário da Rerum Novarum. Pio XI – 1931

Centesimus Annus (CA). No Centenário da Rerum Novarum - 1991

5.   Quadragesimo Anno (QA). Pio XI - 1931


sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Coisas da Eleição














Valter de Oliveira

1.    Guilherme Boulos e o fim dos privilégios

O candidato pessolinha diz que eliminará rapidamente os privilégios abusivos do Judiciário. Como? Simples: só com uma canetada! Podia ter dito que seria com uma varinha mágica... Deve estar vendo muito Harry Potter... Alguém precisa explicar para o rapaz que ele não é nem Ivan, o Terrível e nem Catarina, a Grande!  Talvez esteja sonhando em ser um Robespierre tupiniquim: uma só ordem e pronto: cabeças rolam...
Menos, sr. Boulos, menos. Ou o sr. não sabe que o Judiciário é um poder autônomo?  Lembre-se que mexer nos privilégios do Judiciário ou de quem quer que seja depende de aprovação do Legislativo.

2.    Os candidatos que reencarnam reis absolutistas.

Na mesma linha vemos candidatos à presidência deseducando a população, já tão carente de formação política. Todos dizem: -“Eu faço! Faremos tantos hospitais, tantas creches, tantas ferrovias, tantas”... E ainda, “criarei um novo pacto federativo... teremos salários iguais para homens e mulheres ...;estabelecerei” ...

Por favor, pelo menos dá para dizer ao povo que precisarão apoio de deputados e senadores?  Dá pra dizer que eles é que fazem as leis? Que  votam o orçamento? Fiscalizam o Executivo? Que podem aceitar ou não medidas provisórias? Que é o Senado quem concorda – ou não – com o a indicação do nome de alguém para ocupar o cargo de ministro do STF?

3.    O vice nazista de Bolsonaro!

Suponha uma notícia bomba: -“Confirmado que general Mourão, vice de Bolsonaro, é oficialmente membro do partido nazista!”.

Pode? Não, não pode. Pelo menos no Brasil, graças a Deus. Nos EUA poderia.  Lá a completa liberdade de opinião e sua manifestação são amparadas pela constituição. Até para nazistas!

Mas se o vice for nazista só por convicção?  Seria possível  tê-lo em uma chapa?

Possível sim. Desejável não. Deveria ser abominado. 

E se for do outro lado? Um vice da extrema esquerda?

Aí começa o mistério. A mídia e os intelectuais de esquerda, que são bem informados, não se escandalizam. Olham até com simpatia partidos marxistas tais como o o PCB, o PSTU, o PCO e um dos piores, o PCdoB que se aliou ao PT com Manuela d'Ávila, candidata a vice de Haddad na campanha presidencial.

E quem é o PCdoB? É o partido brasileiro que defendeu os maiores genocidas do século XX: Stalin e Mao Tsé Tung. Os dois mataram muito mais gente que Hitler. Exterminaram milhões e milhões de pessoas de seu próprio povo. Também eliminaram sem piedade membros do próprio partido, incluindo velhos camaradas de revolução.

Pergunto: por que temos aversão por um candidato nazista e não nos envergonhamos de ver a aliança de vários partidos brasileiros (até de “centro” ) com os maiores genocidas  e torturadores de toda a história?

O que responderiam os nossos partidos de esquerda?

O que diz o PT que colocou Manuela como vice?

O que dizem seus militantes?

Você talvez conheça militantes e até dirigentes desses partidos. Ou intelectuais que os apoiam. Quer perguntar?




sábado, 7 de julho de 2018

DEMOCRACIA FORMAL E SUBSTANCIAL














Valter de Oliveira

Aristóteles   e   São Tomás
Na antiguidade Aristóteles, em sua obra sobre política, afirmou que há três formas de governo: a monarquia, a aristocracia e a democracia. S. Tomás, na Idade Média, manteve o mesmo ensinamento. Curiosamente ambos os pensadores afirmavam que a monarquia era a melhor forma.

No mundo moderno e contemporâneo, especialmente após as revoluções liberais do século XVIII, gradualmente a democracia passou a ser tida como mais adequada ao homem de hoje; mesmo nos países que mantiveram a monarquia. É porque passou a se fazer uma distinção entre forma e regime. Este seria baseado em uma série de princípios filosóficos. Concretamente o regime político é o conjunto de regras e critérios que definem quem será o detentor do poder. O regime pode ser democrático ou autoritário, nas suas várias modalidades.

A nós, neste momento, interessa discutir a democracia que existe em nosso país. Todos sabemos que nesse regime político é o povo quem governa. Daí a famosa frase de Abraham Lincoln: “A democracia é o governo do povo, pelo povo e para o povo”.
Essa é a teoria. Na prática nos perguntamos: O Brasil de hoje é realmente uma democracia? Efetivamente exercemos o poder? Este poder é exercido para o bem de todos, para o bem comum?

Para entendermos melhor a questão vamos usar uma distinção que vem sendo usada mais recentemente na Ciência Política. Ela diz respeito às regras democráticas e ao próprio objetivo do governo e do Estado.

No mundo ideal uma sociedade verdadeiramente democrática deve ser, ao mesmo tempo, formal e substancial. No mundo real isso é muito difícil de ser conseguido, se é que seja possível. Em todos os lugares o que se procura é se aproximar do ideal.

Democracia formal

Um país com regime democrático necessita, para bem funcionar, uma série de regras, um conjunto de instituições características dele. Quais são? Primeiramente a representatividade (pessoas que governam em nosso nome). Como são escolhidos? Através do voto universal e secreto. Depois (seguindo sugestão de Montesquieu) temos a autonomia dos poderes (Executivo, Legislativo, Judiciário) que devem procurar atuar em harmonia. O objetivo era impedir que o exercício do poder fosse arbitrário, despótico, como se tornara, até certo ponto, prática nas monarquias absolutas do Antigo Regime. Com o tempo tivemos a formação dos partidos políticos com a ideia do pluripartidarismo, e uma nova ordem jurídica foi constituída (Constituição, leis, jurisprudência). Importante também em uma boa democracia formal são as garantias aos direitos básicos do cidadão e todas as suas liberdades (associação, imprensa, opinião, etc). Em suma, a formalidade consiste em todas as regras e instituições pelos quais a democracia se exerce. Quando são bem feitas e bem constituídas são importantíssimas para um bom desenvolvimento da sociedade.

Democracia substancial

Quando falamos em democracia substancial estamos nos referindo não aos meios (democracia formal), mas aos fins que são alcançados, aos resultados de todo o processo democrático. Dentre seus valores podemos destacar a efetiva ação do Judiciário com a realização concreta da justiça, de um adequado equilíbrio de direitos e deveres na sociedade, a um desenvolvimento econômico sustentável da sociedade com emprego e boas perspectivas de ascensão social. No caso da educação, por exemplo, teríamos tanto escolas públicas quanto particulares de qualidade, de modo a beneficiar toda a sociedade. Todas, dentro de suas peculiaridades, ofereceriam condições para que o estudante se desenvolva plenamente.

Em nosso próximo artigo vamos discutir como o correto entendimento da democracia contribui para entendermos suas relações com a economia, a sociedade, o direito e a política.


segunda-feira, 2 de julho de 2018

ELEIÇÃO DE 2018. DESENCANTO, INDIGNAÇÃO OU ESPERANÇA?












Valter de Oliveira

Dizem que brasileiro não é politizado. É verdade. Muito disso se deve às falhas de nosso sistema educacional. Povo mal formado tem poucas condições de entender o processo político. Isso explica o que muitas vezes ouvi em sala de aula.  

- “Professor, odeio política! Voto porque sou obrigado”.

- Um outro completa: “Políticos são todos iguais, sempre dizem a mesma coisa. Prometem e não cumprem. Só procuram seus interesses!

- E ainda: “Voto em pessoas, não em partidos. Se me parecer confiável e tiver ideias que aprovo, voto no candidato!.

Isso era há 10 ou 20 anos. Agora, com a Lava Jato e a tremenda crise pela qual passa o país, a situação piorou. Existe o desencanto com todos os poderes da República. Critica-se – e com razão – o presidente, o Congresso Nacional, o Judiciário. E não se vê alternativa para se sair desse túnel escuro. Uma minoria, cansada de tudo, sonha com a volta dos militares ao poder. É dar um cheque em branco para quem não se conhece.

O que fazer?

Respondo com um conceito de política muito usado: “política é a arte do possível”. (1)

Em outras palavras, diante da grave crise (2) pela qual passamos não há como, a curto prazo, esperarmos que após as próxima eleições surja o belo mundo que idealizamos. O que podemos fazer hoje  é usar de todos os meios legítimos e legais para tentarmos influenciar bem as pessoas a fim de que votem em candidatos mais dignos e preparados. O pleito eleitoral deste ano  nos permitirá escolhermos um presidente e governadores bem como renovar o Congresso Nacional e as Assembleias Legislativas estaduais. Verdade que as condições de nosso sistema político não nos ajudam, ele está cheio de falhas, todos sabemos disso. Contudo, sempre há algo que podemos vir a fazer. E este algo pode vir a ser muito importante.

Qual seria o primeiro passo?

Muitos diriam: ”escolher candidatos com ficha limpa, homens e mulheres com princípios éticos, ideias claras, bem definidas, que reformem o país e o levem à prosperidade”.

Sem dúvida isso é bom, mas não é o primeiro passo. Por quê?

Porque a primeira coisa necessária para se votar bem é ter ideias claras sobre o que será melhor para o país. Sou eu que, em primeiro lugar, preciso formar minha opinião sobre os principais problemas nacionais e, após isso, escolher os candidatos que mais se aproximam do que penso. O escolhido será nosso representante, aquele que se propõe a fazer no governo, aquilo que você e eu faríamos se lá estivéssemos.

Nada fácil, não é mesmo? A Globo tem perguntado a muita gente que país desejam. Claro que a resposta é quase sempre correta mas, absolutamente genérica: “Melhor educação, prioridade para a saúde do povo, saneamento básico, proteção ao meio ambiente, crescimento econômico, pleno emprego, fim de privilégios inadmissíveis, reforma política, segurança pública, e mil outras coisas boas”. Ora, não há candidato ou partido que não nos prometam tudo isso.

A questão está em como obter tudo isso. Com base em quais ideias, em quais princípios filosóficos, em que tipo de ética (3) se baseiam aqueles que pretendem vir a nos governar. Ora, é de suma importância que conheçamos esse alicerce.  

A partir de hoje publicarei uma série de artigos com breves e simples análises de nossas questões políticas, econômicas, sociais. Serão análises de ideias e também das propostas dos partidos e candidatos. Antes disso veremos alguns pontos básicos sobre democracia e política.

Espero que possam ajudar especialmente ao leitor que não está familiarizado com a política em geral. Para aqueles que tenham tempo, disposição, e mais conhecimento, indicarei artigos ou textos mais aprofundados.

Hoje há muito desencanto e indignação com o que ocorre em nosso país.  Só que os males que existem não devem nos deixar prostrados.  As adversidades existem para serem superadas. Se entendermos isso já daremos um grande passo para que a esperança surja no horizonte.

Notas:

       
 A crise atual é muito profunda mas não deve nos fazer esquecer que há muita coisa boa acontecendo e muita gente lutando pelo bem., o que, infelizmente, não é destacado devidamente. Todo esse bem é motivo de alegria e esperança. Não vê-lo pode esfriar em nós a disposição de lutar.

1.Em um sentido mais específico Política é “a arte de governar, ou seja, a arte de fixar objetivos conforme o bem comum, e orientar sua conquista ou manutenção”.

2.A crise atual é muito profunda mas não deve nos fazer esquecer que há muita coisa boa acontecendo e muita gente lutando pelo bem., o que, infelizmente, não é destacado devidamente. Todo esse bem é motivo de alegria e esperança.

3.Muita gente foi enganada por partidos que se afirmavam éticos. Ora, a ética é parte da filosofia que nos ensina como deve ser o comportamento humano. Acontece que o eleitor comum não sabe que existe uma ética aristotélica ou tomista; uma ética pragmática ou uma ética de princípios; uma ética kantiana ou uma ética marxista. Em suma, quando um candidato se apresenta como ético, se ele não disser quais são os princípios fundamentais de sua ética, ele não estará dizendo absolutamente nada. Se eu afirmo que sigo uma ética tomista ou jusnaturalista segue-se que vou afirmar que ninguém, nem o indivíduo e nem o Estado têm o direito de, voluntariamente, matar um inocente. Por outro lado, se alguém segue uma ética consequencialista ou de resultados, ele admite que mesmo um inocente pode ser eliminado se isso for considerado benéfico para a sociedade. Governos nazistas não viam nenhum problema em eliminar sumariamente doentes mentais. Já o marxismo considera que se pode mentir ou matar inocentes se isso for favorável à causa revolucionária. .