sábado, 16 de julho de 2016

A CORRUPÇÃO QUE CONHEÇO













Valter de Oliveira

Jânio Quadros
Era só um garoto quando ouvi falar pela primeira vez em corrupção. Foi através do rádio que não cansava de tocar a marchinha de Jânio Quadros: “Varre, varre, vassourinha”... Quem era Jânio? Não o conhecia. Nem tinha TV. Finalmente vi sua foto na revista Cruzeiro. Lá estava ele, sentado no meio fio, comendo banana... Não me lembro se era candidato a governador ou a presidente. Não gostei. Não me parecia digno de quem iria, talvez, ocupar um alto cargo no Executivo. E eu nem sabia o que era populismo...

Anos depois, passava pelo viaduto do Chá rumo ao dentista na Conselheiro Crispiniano. Perplexo, deparei-me com uma multidão. Era a famosa “Marcha da Família com Deus pela liberdade”. Um carro da Record filmava tudo. Da época só lembro que se fazia muita greve (estava muito preocupado com futebol, música jovem e Ray Conniff). Era tão comum que eu e um amigo decidimos convocar os colegas para uma greve no Colégio Emília de Paiva Meira, em Itaquera. O sucesso foi rápido. O castigo também. Minha turma pegou 3 dias de suspensão. Achamos graça.

Em outubro de 1964 minha vida mudou totalmente. Motivo: religião. Depois de vacilar por um longo tempo recebi a graça de compreender que valia a pena viver por Deus. Desde então tenho tentado. Deus é paciente...

O resultado é que comecei a preocupar-me com política, filosofia, história, religião. Diariamente lia o Estadão acompanhando tudo o que ocorria no Concílio. E no mundo. Por acréscimo as inúmeras aulas extras que tive com meu professor de História ajudaram muito na minha formação.

As leituras levaram-me, a saber, que os militares argumentavam que haviam tomado o poder para combater três coisas: 1. A subversão. 2. A inflação. 3. A corrupção.


Laudo Natel
Conseguiram sucesso nos dois primeiros pontos. Já quanto à corrupção não tinha ideia. O que sei é que nas duas ocasiões em que estive próximo de dois governadores – Laudo Natel em São Paulo e Eraldo Gueiros em Recife – fiquei incomodado com o séquito de ambos. Tive a impressão de ser um bando de oportunistas. “Conservadores”...
Eraldo Gueiros

No final dos anos 70 tive um contato maior com um jovem engenheiro de uma grande empresa. Começou a enriquecer e resolveu diversificar suas aplicações financeiras. Meu pai trabalhava com imóveis e construção (Construção e decoração já foram meus hobbies). Convidou-nos para uma parceria. Durou algum tempo.

No aprofundamento da amizade soube que ele estava envolvido na intermediação de negócios entre a iniciativa privada e o governo. Foi assim que ele começara a enriquecer. Um dia perguntei-lhe se não achava que tal procedimento feria a ética. Respondeu-me que não. “Ninguém rouba ninguém, disse ele, só se combinam os resultados. Aliás, disse ele, é o único meio que as coisas são feitas no Brasil. Todo mundo ganha um pouco. Tudo é combinado”...

Um belo dia, em visita a seu escritório, perguntei-lhe:

-“Você viu o Ferreira Neto (programa político da TV Gazeta) ontem”?

- “Não”, respondeu. “Por quê?”

- “Fulano (deputado federal bem conhecido na época) fez uma catilinária contra a corrupção do Maluf e do PMDB”.

- “Que pilantra! Dei sete milhões para ele na semana passada”!

Pois é... E soube de várias outras histórias...

Nosso relacionamento comercial durou pouco mais de um ano e passamos a nos ver esporadicamente (1). Um dia, nos tempos do governo Collor fui visita-lo em sua casa. Estava triste e preocupado. De algum modo foi posto de lado nos esquemas governamentais. Ainda tinha, disse-me ele, alguma chance. Se conseguisse um negócio importante relacionado com o projeto do trem bala. (se o começo do negócio desse certo a caixinha seria de 180 milhões de dólares... Para quantos? 7 políticos...) poderia voltar a ter seu espaço no esquema. Soube depois que não conseguiu. Foi perdendo os bens. Morreu. Recentemente contaram-me que sua morte não foi repentina. No hospital tinha recebido os últimos sacramentos. Foi um consolo para mim que também testemunhei muitas coisas boas que ele fez.

Assim, caros amigos, quero deixar bem claro que há muito conheço, por testemunhos fidedignos, a corrupção que assola nosso país. (Evidente que não foi o PT que a inventou... Ele só mergulhou nela, inebriou-se nela).  Depois, quando voltei novamente para a área de História – em 1987 – fui conhecendo-a mais a fundo por leituras e por aulas. Principalmente depois que fiz um mestrado em Estudos Brasileiros na Universidade Mackenzie. Curso idealizado pelo saudoso general Meira Mattos e por Alfredo do Amaral Gurgel.  O melhor que tive na área acadêmica. Nele tive a felicidade de conhecer o amigo – e grande economista da UERJ – Ubiratan Jorge Iório de Souza que me abriu os olhos para os encantos da economia (2).


Tudo isso para dizer que, se desde jovem, como já disse, encantava-me tudo o que é relativo à área de humanas, esse amor cresceu ainda mais a partir de 88 quando vi muita coisa de política e geopolítica. Aprendi a ver Ciência política e Economia com teoria e prática, sem utopismos ideologizantes e sem alienação. Política que naturalmente nada tem a ver com a politicagem rasteira da oligarquia que dirige nosso país.

Vejam! Eu, um simples professor de História, há muito sei como as coisas ocorrem em nossos bastidores. Pergunto: É possível que nossos políticos não saibam?

Deus do Céu! Vejam Roberto Jefferson, no “Mesa Redonda” da Cultura (3). Lá diz ele, claramente, estrondosamente, que é assim que as coisas funcionam no Brasil. O PT só foi mais ousado... O que me impressionou, disse ele, foi a “coragem do PT” em avançar tanto! Depois Dulcídio, no mesmo programa, bateu na mesma tecla (4): “Todos sabem”... E olhando para os jornalistas: “Vocês sabem!” Ninguém o desmentiu...

Pois é. Eu sei, a classe política sabe, os empresários sabem, os jornalistas sabem e... Maravilha, Dilma e Lula, candidamente, nada sabem!

É uma ignorância tão santa que ainda há quem acredite e os queira de volta!

Bem se diz que a esquerda é uma religião.

“Esquerda”? “E o marxismo”?

É seita fundamentalista.



Notas:

(1) os negócios se resumiram na construção de 2 sobrados em um terreno meu.

(2) Lembro-me ainda de uma de nossas primeiras conversas quando ele disse: -“Puxa! Você é o primeiro professor de História que conheço que não é de esquerda!

Um fato curioso: minha formação era de forte oposição ao marxismo mas também ao liberalismo já que defendo a doutrina social da Igreja. Meu caro Bira disse-me que não entendia a oposição do Magistério Católico ao liberalismo. Acontece que o que ele apresentou nas aulas não parecia ser o que as encíclicas criticavam.  Era um liberalismo simpático...pelo menos em economia. Com o tempo parece-me que ele mudou em alguns pontos já que ficou um adepto entusiasmado da escola liberal austríaca. Dá para conciliar tudo? Não sei. Preciso conversar mais com o cara mestre...

(3) Roberto Jefferson no Roda Viva (link https://www.youtube.com/watch?v=wnpQRw01ztQ)


(4) Delcídio no Roda Viva (link https://www.youtube.com/watch?v=h1Aa1K-ky9g)

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