Valter de Oliveira
Começo relembrando o que Pio XI disse na Quadragesimo Anno: O socialismo
“tem uma natureza essencialmente anticristã”. E completa: “pois concebe a
sociedade de modo completamente avesso à verdade cristã”.
É fácil entender? Suponho que não. Primeiro porque são poucos os
católicos que entendem o que seria uma sociedade conforme a concepção cristã
ou, se quiserem, conforme o plano de Deus na história (1). Segundo porque há
quem imagine que basta colocar um rótulo cristão no socialismo para que o
conteúdo passe a ser católico. Brutal engano. Terceiro porque, em concreto, por
exemplo na realidade brasileira, temos partidos socialistas que não esclarecem
que socialismo defendem. Fala-se até em socialismo cristão. Na última eleição
para o governo de São Paulo, por exemplo, muita gente se perguntou se não seria
melhor votar no França e não no Doria.
Obviamente, isso não é uma questão moral para a maior parte dos eleitores mas pode ser problema para quem procura levar a sério a Doutrina
Social Católica.
Dito isso voltemos à análise do socialismo.
Papa João Paulo II |
João Paulo II, na Centesimus
Annus, elogia Leão XIII por sua “extraordinária
lucidez na apreensão, em toda sua crueza, da verdadeira condição dos proletários, homens, mulheres e crianças; por
outro lado a não menor clareza com que intuiu o
o mal de uma solução que, sob a aparência de uma inversão de pobres e
ricos, redundava de fato em detrimento daqueles mesmos que se propunha ajudar. O remédio revelar-se-ia pior que a doença. (...) CA 12
Leão XIII tinha antevisto o que seria o mal do socialismo “como sistema de Estado: aquele que tomaria o
nome de “socialismo real”. A história provou que ele acertara.
Relacionando o que Leão XIII dissera na RN com encíclicas que escrevera
anteriormente João Paulo II (Laborens Exercens e Sollicitudo Rei Socialis)
aprofunda a questão do erro socialista:
“(...) é preciso acrescentar que
o erro fundamental do socialismo é de carácter antropológico. De facto, ele
considera cada homem simplesmente como um elemento e uma molécula do organismo
social, de tal modo que o bem do indivíduo aparece totalmente subordinado ao
funcionamento do mecanismo econômico-social, enquanto, por outro lado, defende
que esse mesmo bem se pode realizar prescindindo da livre opção, da sua única e
exclusiva decisão responsável em face do bem ou do mal. O homem é reduzido a
uma série de relações sociais, e desaparece o conceito de pessoa como sujeito autônomo de decisão moral, que constrói, através dessa decisão, o ordenamento
social. Desta errada concepção da pessoa, deriva a distorção do direito, que
define o âmbito do exercício da liberdade, bem como a oposição à propriedade
privada. O homem, de fato, privado de algo que possa «dizer seu» e da
possibilidade de ganhar com que viver por sua iniciativa, acaba por depender da
máquina social e daqueles que a controlam, o que lhe torna muito mais difícil
reconhecer a sua dignidade de pessoa e impede o caminho para a constituição de
uma autêntica comunidade humana.
Pelo contrário, da concepção cristã da pessoa segue-se necessariamente
uma justa visão da sociedade. Segundo a Rerum novarum e toda a doutrina social da
Igreja, a sociabilidade do homem não se esgota no Estado, mas realiza-se em
diversos aglomerados intermédios, desde a família até aos grupos econômicos,
sociais, políticos e culturais, os quais, provenientes da própria natureza
humana, estão dotados — subordinando-se sempre ao bem comum — da sua própria
autonomia. É o que designei de «subjetividade» da sociedade, que foi anulada
pelo «socialismo real»
Se se questiona ulteriormente onde nasce aquela errada concepção da
natureza da pessoa e da subjetividade da sociedade, é necessário responder que
a sua causa primeira é o ateísmo. É na resposta ao apelo de Deus, contido no
ser das coisas, que o homem toma consciência da sua dignidade transcendente.
Cada homem deve dar esta resposta, na qual se encontra o clímax da sua
humanidade, e nenhum mecanismo social ou sujeito coletivo o pode substituir. A
negação de Deus priva a pessoa do seu fundamento e consequentemente induz a
reorganizar a ordem social, prescindido da dignidade e responsabilidade da
pessoa.
O referido ateísmo está, aliás, estritamente conexo com o racionalismo
iluminista, que concebe a realidade humana e social do homem, de maneira
mecanicista. Nega-se deste modo a intuição última sobre a verdadeira grandeza
do homem, a sua transcendência relativamente ao mundo das coisas, a contradição
que percebe no seu coração entre o desejo de uma plenitude de bem e a própria
incapacidade de o conseguir e, sobretudo, a necessidade da salvação que daí
deriva (Centesimus Annus, 13)
Aqui está a doutrina. Convém entender
melhor seus pontos principais. Depois, cabe a nós vermos na prática, nos
programas dos partidos políticos, nas políticas públicas, na pedagogia
educacional, se o que é proposto é ou não conforme a doutrina católica. Querem
tentar tomando como exemplo o que defende o PT? É um bom exercício.
Notas:
1.
Conforme a teologia Deus teve um plano ao criar a
humanidade. Cada um de nós é único e chamado para ser fiel ao que se pede de
nós. É também nosso dever construir uma sociedade humana o quanto possível
perfeita.
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